Uns 10 000 quilómetros do Pacífico ao Oceano Atlântico, uma distância formidável, mesmo no mundo de hoje e, contudo, uma enorme distância que os seres humanos percorreram num dos maiores empreendimentos da História: a Rota da Seda. Uma rota comercial extremamente lucrativa para além de muitas outras coisas. Durante milhares de anos. produtos exóticos, novas tecnologias, exércitos conquistadores e ideias brilhantes, viajaram ao longo da Rota da Seda. A Rota da Seda ajudou a criar impérios e a derrubá-los. Acendeu os fogos da revolução, motivou grandes explorações, e forjou poderosos laços entre povos muito distantes. A Rota da Seda levou os seres humanos a perceber que há outros povos, noutros locais, e abriu os olhos do oriente e do ocidente. Esta é a história de como o comércio da Rota da Seda produziu muito mais do que dinheiro. É a história épica de como a Rota da Seda ajudou a criar um mundo, um mundo que nos criou. Há 2000 anos, o Império Romano parecia imparável. Roma tinha conquistado grande parte da Europa e estava a enviar as suas legiões para lá do Mediterrâneo oriental, para o Médio Oriente — a porta de acesso às riquezas da Ásia. Mas uma expedição ao oriente podia tornar-se num caminho de sangue. Em 53 a.C. perto da cidade de Carras, na Mesopotâmia, os partas — um império que misturava culturas persas e gregas — enfrentou um exército romano. O resultado da batalha parecia inevitável. Cerca de 40 000 romanos defrontavam apenas 10 000 partas. E s legiões de Roma eram os melhores soldados a pé da Europa. Só havia um problema. O exército parta não lutava a pé. Os partas só tinham cavalaria. Eram arqueiros a cavalo. Versáteis. Rápidos como o vento. Os romanos fizeram o que sempre fziam. Colocavam-se numa posição fixa. Formavam um quadrado oco, defendendo-se de todos os lados. Mas isso não funcionava para os arqueiros partas a cavalo porque podiam cavalgar à volta deles, como fizeram. Galopavam à volta e à volta, e à volta e à volta, disparando enquanto passavam. Milhares e milhares de setas desferidas sobre os romanos. O que os romanos acabaram por fazer foi colocarem-se em formação testudo. Era aquela formação romana em que juntavam os escudos colocando uma camada de escudos a fazer um teto. Testudo é a palavra latina para tartauga. Mas os partas tinham resposta para esta tartaruga. Tinham um martelo para ajudar a abrir a carapaça. O martelo parta era um catafracta, uma palavra grega que significava "vestido de armadura total". Cavalo e cavaleiro usavam pesadas cotas de malha. O catafracta era a antiga palavra equivalente a um tanque de batalha. Em Carras, a carga dos catafactrários rompeu o testudo, expondo os romanos a mais ataques de flechas. Uns 30 000 romanos foram mortos ou capturados. As baixas dos partas foram mínimas. Foi uma das piores derrotas militares de Roma. Mas também pode ter havido mais qualquer coisa. Um historiador romano escreveu que os partas encandearam os romanos com estandartes feitos com um bonito tecido, seda. Isto pode ser apenas uma lenda, mas, por volta da época de Carras, os romanos começavam a cobiçar a seda, e a China começava a vender seda a Roma, em troca de requintados objetos de vidro romanos e de ouro, inspirando o nome que damos hoje ao comércio da Eurásia: a Rota da Seda. Mas, muito antes de romanos e partas lutarem em Carras, o comércio entre os povos da Eurásia já modelavam vidas, possibilitando coisas novas e alterando o mundo. Em Carras, os partas ganharam com um estilo de batalha que tinha evoluído séculos antes e a milhares de quilómetros de distância. Nas estepes da Ásia Central, um oceano de terra, onde a vitória na batalha e a própria vida dependia de uma movimentação para muito longe, muito rapidamente. Milhares de anos antes da batalha de Carras, uma revolução nos transportes ocorrera nessas vastas planícies. Há bons indícios da existência de cavalosdomesticados naquilo que é hoje o Cazaquistão e o sul da Rússia, em 3500 a.C. Pensamos mesmo que, provavelmente, os cavalos foram domesticados e começaram a ser cavalgados 500 ou talvez 1000 anos antes disso, talvez em 4500 a.C. A domesticação de cavalos foi o primeiro passo para a guerra com cavalaria. Mas o segundo passo demoraria ainda muito tempo. O primeiro uso de cavalos na guerra foi a guerra com carrinhos, e temos isso comprovado com o carrinho de Tutankhamon, que muitas pessoas já viram em exposições em museus. Sabemos que as pessoas usavam carrinhos em batalhas no Próximo Oriente por volta de 1600, 1700 a.C. Os cavalos só foram utilizados como uma cavalaria organizada por volta de 900 a.C., quase 1000 anos depois de começarem os carrinhos em batalhas. Sempre me pareceu estranho que a cavalaria seja posterior aos carrinhos. Os carinhos são muito difíceis de guiar. É preciso treinar os cavalos a funcionar em conjunto. Têm de puxar aquele veículo desajeitado que leva duas pessoas: um condutor e um guerreiro. Treinar as unidades para funcionarem em conjunto, é uma coisa difícil, enquanto saltar para cima de um cavalo é muito fácil. Portanto, porque é que a cavalaria vem depois dos carrinhos? Penso que a verdadeira razão por que a cavalaria esperou é que é preciso ter três inovações. A primeira prova da existência do arco recurvo encontra-se na Dinastia Shang, na China, provavelmente datado entre 1300 e 1100 a.C. Os imperadores Shang comunicavam com os seus antepassados aquecendo ossos de animais ou carapaças de tartaruga até estalarem e depois interpretando os padrões feitos pelas fissuras. Um destes ossos, chamados oráculos, tem gravado o carácter chinês para arco — a imagem mais antiga conhecida de um arco recurvo. E, no túmulo de Fu Hao — uma imperatriz consorte e comandante militar de renome — os arqueólogos encontraram mais provas. É uma proteção para o polegar para puxar a corda do arco e há outra peça que se situa no meio de um arco recurvo, uma mola de mão. Os arcos propriamente ditos não ficaram preservados, por isso é difícil identificar as origens do arco recurso. Os seus diversos componentes provavelmente provêm de diferentes locais geográficos. Até onde o arco recurvo viajou através da Eurásia foi revelado em 2005, em Yanghai, na região de Xinjiang, na China. Os arcos de madeira raramente sobrevivem ao enterramento no solo, mas o clima frio e seco de Xinjiang preservou um deles, num túmulo com 3000 anos. Outros objetos fúnebres e restos humanos encontrados nos túmulos de Yanghai confirmaram que o arco tinha sido fabricado por Citas, uma cultura altamente sofisticada com origem no sul da Rússia e que migraram a cavalo or toda a extensão da Eurásia. O verdadeiro berço do arco recurvo composto mantém-se um mistério arqueológico. Mas não há dúvidas de que, há 3000 anos, quem lutasse a cavalo tê-lo-ia considerado revolucionário. Um arco é tanto mais forte quanto mais longo for. A sua força depende do seu comprimento. E o arco recurvo tem o mesmo comprimento neste arco muito curto que pode ser usado sobre a traseira do cavalo ou sobre o pescoço do cavalo. E era muito mais fácil de usar montado a cavalo. Os arcos recurvos, tecnologicamente, são muito difíceis de construir. Demorou muito tempo para desenvolver a arte de fazer arcos, até chegar a este ponto, todas estas curvas — reflexo e deflexo — que lhe dão uma elasticidade incorporada. Mas isso só pode ser criado com materiais compostos, ou seja, é fabricado com uma série de materiais. O grosso é a madeira, geralmente de faia. Depois, o corno, o coro de búfalo asiático. e depois os tendões de um animal. Quando os esmagamos, obtemos estas fibras muito finas, fibras com uma força de tração tremenda que tem elasticidade e mola e impede que o arco se parta. Há materiais que melhoram a potência e a mola do arco. Mas só se os fabricantes de arcos conseguirem resolver um grande problema. Como impedir que um arco tão potente feito de materiais tão diferentes se parta, quando é o seu próprio poder que o separa? Algures na Eurásia, há muito tempo, um génio desconhecido descobriu a resposta. Esta é a bexiga natatória de um esturjão — um peixe do Mar Negro. Se a desfizermos e a pusermos em água quente obtemos esta cola viscosa, maravilhosa. Esta simples ideia de fazer uma cola duma bexiga natatória de um peixe foi um avanço tecnológico de consequências imensas. Foi o que permitiu a existência do arco composto. E, por sua vez, o arco composto foi uma revolução militar de consequências de grande alcance. O arco recurvo composto deu origem a um novo tipo de guerreiro, o arqueiro a cavalo. O arqueiro a cavalo conseguia disparar, sentado na sela, em parte por causa da nova tecnologia do arco composto. Eram arcos curtos, compactos, e isso significava que podiam dispará-los a cavalo. Estão a ver, posso virar-me para o outro lado do cavalo, posso virar-me e disparar para trás. É muito mais adequado para disparar a cavalo. Todos os que lutaram com nómadas da Eurásia, quer fossem inimigos ou amigos, queriam um arco recurvo composto. No início do primeiro milénio a.C., era usado da Ásia oriental à Europa oriental. Um arco recurvo fava a um arqueiro a cavalo um poder letal sem precedentes. Mas não fazia deles um cavaleiro. Antes de os arqueiros poderem lutar como uma força militar efetiva, precisavam de um grande fornecimento de flechas idênticas. E isso era uma coisa que não existia. As pontas das flechas tinham uma série de diferentes tamanhos e pesos. Umas eram feitas de osso. Outras eram feitas de sílex. Outras eram feitas de bronze. Todas elas eram feitas individualmente e tínhamos de ajustar o nosso tiro segundo o peso de diferentes flechas. Também, uma unidade de soldados que disparavam ao mesmo tempo, estariam a disparar flechas de pesos ligeiramente diferentes que podiam alcançar diferentes distâncias. Uma das características duma ponta de flecha de pedra é a sua parte traseira achatada. Mas como é que isso se relacionava com a haste da flecha? Só podia estar ligada à haste por uma corda ou por tendões. Mas as desvantagens? Primeiro, as setas lançadas tendem a mudar de direção facilmente. Em segundo lugar, são suscetíveis de cair. Uma das inovações tecnológicas foi a invenção da ponta de flecha com encaixe. Habitualmente, eram feitas de bronze, e eram feitas num molde e fundidas num molde,