Uns 10 000 quilómetros
do Pacífico ao Oceano Atlântico,
uma distância formidável,
mesmo no mundo de hoje
e, contudo, uma enorme distância
que os seres humanos percorreram
num dos maiores empreendimentos da História:
a Rota da Seda.
Uma rota comercial
extremamente lucrativa
para além de muitas outras coisas.
Durante milhares de anos.
produtos exóticos,
novas tecnologias,
exércitos conquistadores
e ideias brilhantes,
viajaram ao longo da Rota da Seda.
A Rota da Seda ajudou a criar impérios
e a derrubá-los.
Acendeu os fogos da revolução,
motivou grandes explorações,
e forjou poderosos laços
entre povos muito distantes.
A Rota da Seda levou
os seres humanos a perceber
que há outros povos, noutros locais,
e abriu os olhos
do oriente e do ocidente.
Esta é a história de como o comércio
da Rota da Seda produziu muito mais do que dinheiro.
É a história épica de como a Rota da Seda
ajudou a criar um mundo,
um mundo que nos criou.
Há 2000 anos, o Império Romano
parecia imparável.
Roma tinha conquistado
grande parte da Europa
e estava a enviar as suas legiões
para lá do Mediterrâneo oriental,
para o Médio Oriente
— a porta de acesso às riquezas da Ásia.
Mas uma expedição ao oriente
podia tornar-se num caminho de sangue.
Em 53 a.C. perto da cidade de Carras,
na Mesopotâmia,
os partas — um império que misturava
culturas persas e gregas —
enfrentou um exército romano.
O resultado da batalha
parecia inevitável.
Cerca de 40 000 romanos
defrontavam apenas 10 000 partas.
E s legiões de Roma eram
os melhores soldados a pé da Europa.
Só havia um problema.
O exército parta não lutava a pé.
Os partas só tinham cavalaria.
Eram arqueiros a cavalo.
Versáteis. Rápidos como o vento.
Os romanos fizeram
o que sempre fziam.
Colocavam-se numa posição fixa.
Formavam um quadrado oco,
defendendo-se de todos os lados.
Mas isso não funcionava
para os arqueiros partas a cavalo
porque podiam cavalgar à volta deles,
como fizeram.
Galopavam à volta e à volta,
e à volta e à volta,
disparando enquanto passavam.
Milhares e milhares de setas
desferidas sobre os romanos.
O que os romanos acabaram por fazer
foi colocarem-se em formação testudo.
Era aquela formação romana em que
juntavam os escudos
colocando uma camada de escudos
a fazer um teto.
Testudo é a palavra latina para tartauga.
Mas os partas tinham resposta
para esta tartaruga.
Tinham um martelo para ajudar
a abrir a carapaça.
O martelo parta era um catafracta,
uma palavra grega que significava
"vestido de armadura total".
Cavalo e cavaleiro usavam
pesadas cotas de malha.
O catafracta era a antiga palavra
equivalente a um tanque de batalha.
Em Carras, a carga dos catafactrários
rompeu o testudo,
expondo os romanos
a mais ataques de flechas.
Uns 30 000 romanos
foram mortos ou capturados.
As baixas dos partas foram mínimas.
Foi uma das piores derrotas
militares de Roma.
Mas também pode ter havido
mais qualquer coisa.
Um historiador romano escreveu
que os partas encandearam os romanos
com estandartes feitos
com um bonito tecido,
seda.
Isto pode ser apenas uma lenda,
mas, por volta da época de Carras,
os romanos começavam a cobiçar a seda,
e a China começava a vender seda a Roma,
em troca de requintados objetos de vidro
romanos e de ouro,
inspirando o nome que damos
hoje ao comércio da Eurásia:
a Rota da Seda.
Mas, muito antes de romanos e partas
lutarem em Carras,
o comércio entre os povos
da Eurásia já modelavam vidas,
possibilitando coisas novas
e alterando o mundo.
Em Carras, os partas ganharam
com um estilo de batalha
que tinha evoluído séculos antes
e a milhares de quilómetros de distância.
Nas estepes da Ásia Central,
um oceano de terra,
onde a vitória na batalha
e a própria vida
dependia de uma movimentação
para muito longe, muito rapidamente.
Milhares de anos
antes da batalha de Carras,
uma revolução nos transportes
ocorrera nessas vastas planícies.
Há bons indícios da existência
de cavalosdomesticados
naquilo que é hoje o Cazaquistão
e o sul da Rússia, em 3500 a.C.
Pensamos mesmo que, provavelmente,
os cavalos foram domesticados
e começaram a ser cavalgados
500 ou talvez 1000 anos antes disso,
talvez em 4500 a.C.
A domesticação de cavalos
foi o primeiro passo
para a guerra com cavalaria.
Mas o segundo passo
demoraria ainda muito tempo.
O primeiro uso de cavalos na guerra
foi a guerra com carrinhos,
e temos isso comprovado
com o carrinho de Tutankhamon,
que muitas pessoas já viram
em exposições em museus.
Sabemos que as pessoas
usavam carrinhos em batalhas
no Próximo Oriente por volta
de 1600, 1700 a.C.
Os cavalos só foram utilizados
como uma cavalaria organizada
por volta de 900 a.C.,
quase 1000 anos depois de começarem
os carrinhos em batalhas.
Sempre me pareceu estranho
que a cavalaria seja posterior aos carrinhos.
Os carinhos são muito difíceis de guiar.
É preciso treinar os cavalos
a funcionar em conjunto.
Têm de puxar aquele veículo desajeitado
que leva duas pessoas:
um condutor e um guerreiro.
Treinar as unidades para funcionarem
em conjunto, é uma coisa difícil,
enquanto saltar para cima de um cavalo
é muito fácil.
Portanto, porque é que a cavalaria
vem depois dos carrinhos?
Penso que a verdadeira razão
por que a cavalaria esperou
é que é preciso ter
três inovações.
A primeira prova da existência do arco recurvo
encontra-se na Dinastia Shang, na China,
provavelmente datado entre 1300 e 1100 a.C.
Os imperadores Shang comunicavam
com os seus antepassados
aquecendo ossos de animais
ou carapaças de tartaruga até estalarem
e depois interpretando os padrões
feitos pelas fissuras.
Um destes ossos, chamados oráculos,
tem gravado o carácter chinês
para arco
— a imagem mais antiga conhecida
de um arco recurvo.
E, no túmulo de Fu Hao
— uma imperatriz consorte
e comandante militar de renome —
os arqueólogos encontraram mais provas.
É uma proteção para o polegar
para puxar a corda do arco
e há outra peça que se situa
no meio de um arco recurvo,
uma mola de mão.
Os arcos propriamente ditos
não ficaram preservados,
por isso é difícil identificar
as origens do arco recurso.
Os seus diversos componentes
provavelmente provêm de diferentes
locais geográficos.
Até onde o arco recurvo
viajou através da Eurásia
foi revelado em 2005, em Yanghai,
na região de Xinjiang, na China.
Os arcos de madeira raramente sobrevivem
ao enterramento no solo,
mas o clima frio e seco de Xinjiang
preservou um deles,
num túmulo com 3000 anos.
Outros objetos fúnebres
e restos humanos
encontrados nos túmulos de Yanghai
confirmaram que o arco
tinha sido fabricado por Citas,
uma cultura altamente sofisticada
com origem no sul da Rússia
e que migraram a cavalo
or toda a extensão da Eurásia.
O verdadeiro berço
do arco recurvo composto
mantém-se um mistério arqueológico.
Mas não há dúvidas
de que, há 3000 anos,
quem lutasse a cavalo
tê-lo-ia considerado revolucionário.
Um arco é tanto mais forte
quanto mais longo for.
A sua força depende do seu comprimento.
E o arco recurvo
tem o mesmo comprimento
neste arco muito curto
que pode ser usado sobre a traseira do cavalo
ou sobre o pescoço do cavalo.
E era muito mais fácil de usar
montado a cavalo.
Os arcos recurvos, tecnologicamente,
são muito difíceis de construir.
Demorou muito tempo para desenvolver
a arte de fazer arcos, até chegar a este ponto,
todas estas curvas
— reflexo e deflexo —
que lhe dão uma elasticidade incorporada.
Mas isso só pode ser criado
com materiais compostos,
ou seja, é fabricado
com uma série de materiais.
O grosso é a madeira,
geralmente de faia.
Depois, o corno,
o coro de búfalo asiático.
e depois os tendões de um animal.
Quando os esmagamos,
obtemos estas fibras muito finas,
fibras com uma força de tração tremenda
que tem elasticidade e mola
e impede que o arco se parta.
Há materiais que melhoram
a potência e a mola do arco.
Mas só se os fabricantes de arcos
conseguirem resolver um grande problema.
Como impedir que um arco tão potente
feito de materiais tão diferentes
se parta, quando é o seu próprio poder
que o separa?
Algures na Eurásia, há muito tempo,
um génio desconhecido descobriu a resposta.
Esta é a bexiga natatória de um esturjão
— um peixe do Mar Negro.
Se a desfizermos e a pusermos em água quente
obtemos esta cola viscosa, maravilhosa.
Esta simples ideia de fazer uma cola
duma bexiga natatória de um peixe
foi um avanço tecnológico
de consequências imensas.
Foi o que permitiu a existência
do arco composto.
E, por sua vez, o arco composto
foi uma revolução militar
de consequências de grande alcance.
O arco recurvo composto
deu origem a um novo tipo de guerreiro,
o arqueiro a cavalo.
O arqueiro a cavalo conseguia
disparar, sentado na sela,
em parte por causa da nova tecnologia
do arco composto.
Eram arcos curtos, compactos,
e isso significava que podiam
dispará-los a cavalo.
Estão a ver, posso virar-me
para o outro lado do cavalo,
posso virar-me e disparar para trás.
É muito mais adequado
para disparar a cavalo.
Todos os que lutaram
com nómadas da Eurásia,
quer fossem inimigos ou amigos,
queriam um arco recurvo composto.
No início do primeiro milénio a.C.,
era usado da Ásia oriental
à Europa oriental.
Um arco recurvo fava a um arqueiro a cavalo
um poder letal sem precedentes.
Mas não fazia deles um cavaleiro.
Antes de os arqueiros poderem lutar
como uma força militar efetiva,
precisavam de um grande fornecimento
de flechas idênticas.
E isso era uma coisa que não existia.
As pontas das flechas tinham
uma série de diferentes tamanhos e pesos.
Umas eram feitas de osso.
Outras eram feitas de sílex.
Outras eram feitas de bronze.
Todas elas eram feitas individualmente
e tínhamos de ajustar o nosso tiro
segundo o peso de diferentes flechas.
Também, uma unidade de soldados
que disparavam ao mesmo tempo,
estariam a disparar flechas
de pesos ligeiramente diferentes
que podiam alcançar diferentes distâncias.
Uma das características
duma ponta de flecha de pedra
é a sua parte traseira achatada.
Mas como é que isso se relacionava
com a haste da flecha?
Só podia estar ligada à haste
por uma corda ou por tendões.
Mas as desvantagens?
Primeiro, as setas lançadas
tendem a mudar de direção facilmente.
Em segundo lugar, são suscetíveis de cair.
Uma das inovações tecnológicas
foi a invenção da ponta de flecha
com encaixe.
Habitualmente, eram feitas de bronze,
e eram feitas num molde
e fundidas num molde,
de maneira que podiam ser feitas
num mesmo molde
um número infinito de pontas
de flechas com o mesmo peso.
Fazer pontas aguçadas
era uma coisa muito difícil.
É preciso ter um molde com um núcleo
onde vai ficar o encaixe,
que pode ser rodeado por metal derretido
para obter a mesma espessura
a toda a volta.
Fazer pontas de flechas
do mesmo tamanho e peso
foi mais uma revolução tecnológica
da Ásia Central.
Pela primeira vez, os guerreiros a cavalo
podiam fazer ataques de flechas
coordenados aos seus inimigos.
Com pontas de flechas do mesmo peso,
sempre que esticavam o arco para disparar
sabiam que estavam a disparar uma flecha
que tinha exatamente o mesmo peso
da última flecha que tinham disparado,
por isso podiam determinar bem
o alcance e a distância.
Além disso, todos os arqueiros
que estavam a disparar,
estavam a disparar flechas
do mesmo peso, ao mesmo tempo.
Assim, a distância seria a mesma
para todos eles.
Com uma ponta de flecha com encaixe
podíamos inserir diretamente
a cabeça no veio,
desta forma.
Então, quais são as vantagens
deste tipo de ponta de flecha?
Melhora consideravelmente
a letalidade e a eficácia
das flechas antigas.
Mesmo no caos da guerra,
o arqueiro podia visar facilmente o alvo.
Não perdia a direção
ao visar o alvo rapidamente.
Esta invenção é um salto gigantesco
na evolução da história humana.
Os arqueólogos pensam que, algures,
no segundo milénio a.C.,
as pontas de flechas de bronze com encixe
começaram a espalhar-se no oriente
enquanto o arco recurvo
se espalhava para ocidente.
Algures por volta de 900 a.C.,
as pontas de flecha com encaixe
e os arcos recurvos
juntaram-se na área
da Bacia Tarim na Ásia Central,
levadas por mercadores,
guerreiros e emigrantes nómadas.
Após 700 a.C., começamos a ver
milhares e milhares de pontas de flechas
e dezenas de pontas de flechas
numa única aljava numa sepultura.
É como se estivessem a ser
produzidas em massa.
As pontas de flechas de bronze com encaixe
transformaram a Ásia Central num arsenal,
mas só foi possível
a existência da cavalaria
quando os guerreiros
passaram a ser soldados.
Foi de facto a era da guerra heroica
— os indivíduos fazerem
grandes feitos por si próprios
e atraírem a glória para o seu nome.
É o tipo de guerra que é descrito
na Ilíada, na Odisseia ou no Rigveda,
um texto religioso que constitui
profundas raízes do hinduísmo moderno.
O que tinha de mudar
era uma mudança psicológica
na natureza do guerreiro.
Era preciso mudar
dos indivíduos para unidades
que funcionavam sob o comando
dum general comandante,
que atacaria e recuaria
conforme o comando.
A mudança psicológica
do guerreiro heroico para o soldado,
provavelmente é uma característica
da guerra urbana,
dos exércitos que estavam associados
às grandes cidades
da Mesopotâmia e do Irão.
Essa psicologia teve de se espalhar
para norte até às estepes
e ser aceite pelos guerreiros
nas estepes,
na mesma área onde
os arcos recurvos
e as pontas de flecha com encaixe
se cruzaram.
Enquanto os arcos recurvos
se espalhavam para ocidente
e as pontas de flecha com encaixe
se espalhavam para oriente,
o conceito de disciplina militar
espalhava-se para norte.
Algures por volta de 900 a.C.,
juntaram-se todos os três
no meio da Ásia Central.
Quando estas três coisas se juntaram,
a cavalaria tornou-se numa forma
de força militar realmente mortífera.
Uma força que iria testar fortemente
os exércitos mais poderosos do mundo antigo.
Há 2200 anos,
quando os romanos avançaram para leste,
para expandir o seu império,
a China estava a avançar para oeste.
E, tal como os romanos,
os chineses encontraram um inimigo
formidável a cavalo.
Os Xiongnu eram nómadas
das estepes da Ásia Central.
Armados com arcos recurvos,
e flechas com encaixe,
lutavam sob as ordens de comandantes
como uma força militar disciplinada.
Atacavam aldeias chinesas
e saqueavam o comércio crescente
entre o ocidente e o oriente.
E ninguém conseguia detê-los.
Os Xiongnu foram as dores de cabeça
do mundo antigo, para os chineses.
Continuavam a aparecer
e ninguém os conseguia deter.
The Xiongnu cobiçavam os bens materiais
mais finos produzidos pelos chineses.
Era por isso que os atacavam.
Imaginem que são um aldeão na China
e esses homens aparecem de nenhures.
Aparecem por detrás da colina
sem avisarem
destruindo a vossa aldeia.
Matam o vosso chefe,
matam o vosso marido.
Perseguem as mulheres.
Não há possibilidade de se esconderem
e há um turbilhão de poeira e de flechas.
Eles entram e saem
pegam nas coisas e vão-se embora.
A China enviou o seu poder militar
contra os Xiongnu.
Os famosos Guerreiros de Terracota
revelam a dimensão e o poder
dos exércitos chineses.
Mas os chineses lutavam a pé
e com carrinhos,
sem eficácia contra a cavalaria
que atacava e fugia.
Um cortesão chinês escreveu
que os Xiongnu se movimentavam
como um bando de aves sobre o terreno,
impossíveis de controlar.
Depois de a guerra montada
se tornar mortal e efetiva,
tornou-se um problema real.
Os nómadas sabem sempre
onde está o agricultor.
A nossa casa está no mesmo local
12 meses por ano,
e quando as culturas estão maduras
é preciso fazer a colheita
e os nómadas sabem quando
é que é essa estação.
Enquanto que, se tentamos rechaçá-los,
é impossível saber onde é que eles vão atacar
ou quando vão estar aqui.
Temos de tentar encontrá-los.
Para vencer os Xiongnu, os chineses
precisavam de soldados que lutassem como eles.
Precisavam de cavalaria.
Há manuais de guerra
que foram escritos
para instruir os guerreiros chineses
sobre como combater as táticas
e os métodos dos Xiongnu.
Esses manuais introduziram
a ideia da cavalaria
no exército chinês.
O exército chinês só terá
usado a cavalaria
provavelmente por volta de 350 a.C.
O exército chinês, a princípio
com alguma resistência
por parte das antigas
famílias aristocráticas, dizia:
"O meu pai combateu num carrinho,
"e o pai dele combateu num carrinho,
"e eu vou continuar a combater num carrinho
com os fatos compridos tal como os meus antepassados."
Mas não demorou muito
até que os guerreiros chineses
trocassem as suas tradicionais
túnicas compridas e esvoaçantes,
por túnicas mais curtas
que não atrapalhassem na luta a cavalo.
Por fim, a necessidade prática
forçou-os a livrarem-se das túnicas
e a usarem calças de montar,
para aprenderem disparar o arco
a cavalo,
e também eles se tornaram
numa poderosa força de arqueiros a cavalo.
A cavalaria chinesa tornou-se especialista
em disparar o arco recurvo composto,
e uma arma chinesa letal, a besta.
Enquanto a cavalaria treinava,
a China concordou com a exigência dos Xiongnu
de fazer pagamentos em dinheiro e seda
até ao ano de 133 a.C.,
quando o Imperador Han Wudi
se recusou a pagar
e enviou o seu exército
para atacar os Xongnu.
A cavalaria chinesa derrotou os nómadas
e a China apoderou-se
de novos territórios nas estepes,
pacificando novas rotas
e abrindo novos horizontes.
Por um lado,
temos este conflito permanente
— na cultura chinesa seriam
os Xiongnu e os chineses Han
que criaram uma guerra incessante.
Por outro lado, foi este conflito
que destruiu as fronteiras físicas.
Até as fronteiras territoriais
estavam sempre a ser empurradas,
entre as duas forças.
Isso constituía um estímulo para as trocas,
para trocas políticas,
para novas ideias, para tradições artísticas.
Também foi uma nova era para a Rota da Seda.
Uma fortuna em ouro romano
viajava para leste
em troca das sedas chinesas.
E o reino de Kushan,
na Ásia Central,
fez fortuna vendendo à China
outro bem de luxo:
o jade.
As caravanas da Rota da Seda passavam
por este posto fronteiriço
na fronteira ocidental da China.
Tantas transportavam jade de Kushan
que este posto ficou conhecido
por Portão de Jade.
Os aristocratas chineses
cobiçavam o jade pela sua beleza
e por uma outra coisa.
Acreditavam que o jade
os manteria vivos para sempre.
A elite governante encomendava
fatos funerários de jade
para preservar os corpos na sepultura.
Acreditavam que, depois de mortos,
todos os orifícios deviam ser tapados
para preservar o espírito
no interior da pessoa.
Esta noção do jade
enquanto material com poderes de proteção
na vida além-túmulo,
ainda era reforçada
pelo facto de construírem
uma armadura
feita de milhares de peças de jade.
E, claro, para o imperador,
a armadura de jade seria feita
do jade mais fino,
das regiões ocidentais.
Durante o império romano,
o comércio a Rota da Seda floresceu
enquanto os exércitos chinês,
persa e Kushan
mantinham as rotas comerciais
abertas através da Eurásia.
A China tinha equilibrado
o campo de batalha
com os invasores nómadas das estepes.
Mas os arqueiros a cavalo da Ásia Central
estavam prestes a gravar
os seus nomes na História.
No século IV d.C., a Europa foi invadida
por povos da Ásia Central
cujo nome ainda evoca
uma crueldade bárbara.
Os Hunos, que abriram à força
o caminho para oeste, até Roma.
Povos europeus
como os Godos e os Visigodos
— os chamados bárbaros —
fugiram perante aquela investida
e procuraram refúgio em território romano.
Quando os Hunos se retiraram
do mundo romano,
esses bárbaros refugiados
mantiveram-se onde estavam.
E o resto é História.
O império romano do ocidente
estava mergulhado no caos
quando as tribos bárbaras,
descontentes com a sua sorte,
se revoltaram contra a autoridade romana
e os fracos imperadores romanos
não conseguiram esmagá-las.
À medida que Roma entrava em declínio,
arqueiros a cavalo migrantes, chamados Avares,
criaram o seu país na Europa de leste,
levando com eles outra inovação
militar asiática:
o estribo.
Esta estátua chinesa
do século IV d.C.,
é a mais antiga representação
dos estribos.
Uns 300 anos depois,
um cavaleiro Avar
atravessou a Hungria
com estes estribos.
No século VIII d.C.,
os estribos tinham-se espalhado
de uma ponta da Eurásia até à outra
e a guerra montada
entrava numa nova era.
A importância do estribo
está ligada ao tipo de armas
que podemos usar a cavalo
e tornou possível use certos tipos
de armas a cavalo
que não seria possível usar sem estribos.
Essas armas são o sabre comprido.
Precisamos de nos inclinar e absorver o choque,
se queremos usar
um sabre comprido em batalha.
E os estribos permitem que o cavaleiro
absorva o choque
do contacto com um alvo fixo.
A outra grande arma
que se tornou possível com os estribos
foi a lança presa debaixo do braço.
Era possível apunhalar uma pessoa
com a lança e depois retirá-la,
passando por ela, sem estribos.
Mas, se a prendêssemos debaixo do braço,
e usássemos a lança como uma arma de choque
seríamos derrubados do cavalo
se não tivéssemos estribos.
Portanto, os estribos tornaram possível
o uso de espadas e lanças compridas
como armas de choque
contra alvos fixos
mantendo-nos na sela.
E, claro, isso tornou possível ter
guerreiros montados pesados.
Agora o cavaleiro passa a ser um só
com o seu cavalo.
Está muito bem apoiado nos estribos,
apoiado nisto
e depois, com a sua lança comprida
torna-se numa única unidade de projeção.
Homem, cavalo, sela, lança,
tudo junto para a carga de impacto.
Foi a época do cavaleiro medieval.
O poder de um cavaleiro medieval
era fruto da combinação do estribo asiático
e da antiga tática de choque
da catafracta persa
com uma invenção europeia:
a armadura de placas articuladas.
Suficientemente forte para proteger o utilizador
dos ataques de espada e de lança
embora suficientemente leve para lhe permitir
mover-se livremente a cavalo
e a pé.
A cavalaria pesada nunca tinha sido
uma arma de guerra tão poderosa.
A batalha montada medieval
podia ser uma batalha
que gerava muita força
sobre o cavaleiro,
uma batalha de grande impacto.
Neste caso, o guerreiro montado
está a ser usado
como uma arma de choque
para derrubar o inimigo.
Mas mesmo os formidáveis
cavaleiros montados da Europa
viriam a ser derrotados
pela cavalaria da Ásia Central
que irromperam das estepes
e mudaram o mundo.
O maior império conquistado
que a Terra já viu
foi criado por nómadas pastoris
da Ásia Central.
No século XIII,
os Mongóis conquistaram
para Oeste até à Polónia
e para Leste até ao Mar do Japão.
Os exércitos mongóis combinaram
as táticas de choque devastadoras
dos arqueiros a cavalo
com uma organização militar
altamente sofisticada.
Podiam reunir rapidamente
e marchar até distantes campos de batalha.
Depois, a cavalaria chegaria
ao campo de batalha do inimigo,
antes de este organizar a defesa
que pudesse deter o inimigo
psicológica e estrategicamente.
Diz-se que a cavalaria surgia
repentinamente
como uma coisa que caía do céu
e desaparecia rapidamente
sem deixar vestígio.
O ocidente, em especial
os historiadores europeus,
escreveram que os Mongóis apareciam
muito ao longe, como vários pontos,
mas de repente juntavam-se
à nossa frente, como nuvens escuras.
O ataque inesperado era o hábito.
Os Mongóis ficaram na História
como assassinos sedentos de sangue
mas também eram sofisticados,
de mente aberta,
frequentemente conquistadores generosos.
Pacificaram a Rota da Seda.
O comércio entre o Ocidente e o Oriente
floresceu durante esta paz
imposta pelos Mongóis,
a Pax Mongolica.
Antes da época da Pax Mongolica,
o banditismo era um problema
muito grave para os mercadores,
para as caravanas ao longo da Rota da Seda.
A reputação de Genghis Khan
e dos seus descendentes
criou a paz e a passagem em segurança
ao longo da Rota da Seda
porque os bandidos tinham muito medo
dos soldados mongóis.
A Pax Mongolica,
o controlo do comércio e das trocas
que se tornaram possíveis
com os Mongóis
ligaram a China à Europa
e ao Próximo Oriente
de forma sustentada
pela primeira vez na História mundial.
E isso teve um profundo efeito
no desenvolvimento
da civilização europeia.
Protegidos pela Pax Mongolica
e ansiosos por boas relações
com o império Mongol,
os europeus começaram a viajar
para leste como nunca antes.
Mercadores, missionários e diplomatas
afluíam ao Leste ao longo das rotas comerciais,
trazendo bens asiáticos populares
como panos e especiarias
e relatos das riquezas
e das maravilhas do Oriente,
alguns verdadeiros, outros fabulosos,
mas todos eles fascinantes.
Da Europa até à China,
o comércio da Rota da Seda espalhou
novos conhecimentos de terras longínquas.
A Rota da Seda levou os seres humanos
a perceber
que havia outros povos além deles,
e isso abriu os olhos
ao Oriente e ao Ocidente.
As cidades italianas de Veneza e Génova
colhiam enormes recompensas.
Os seus mercadores viajavam com segurança
por toda a Eurásia
e fundavam postos comerciais
o Mar Negro
para receber e transacionar bens
na Rota da Seda.
Os lucros da Rota da Seda financiavam
a magnífica arte e arquitetura.
Mas a competição entre elas mergulhava-as
com frequência em guerra umas contra as outras.
Numa dessas guerras, Génova capturou
um próspero mercador veneziano
chamado Marco Polo.
Preso pelos genoveses,
Polo ditou a história da sua viagem
à China, pela Rota da Seda,
a um outro prisioneiro.
Os especialistas debatem hoje
se Marco Polo visitou mesmo a Chin
ou se se limitou a repetir
as histórias que ouviu contar
a viajantes da Rota da Seda.
Mas ninguém discute que
"As viagens de Marco Polo"
foi um dos livros mais influentes
em toda a História da Humanidade.
Seduziu a Europa com os contos
da enorme riqueza da China
e a sua civilização avançada.
Anos antes de Marco Polo contar
essas histórias numa prisão genovesa,
uma invenção chinesa atravessava
a Eurásia, a caminho do Ocidente.
Uma coisa criada séculos antes
quando uma experiência acabara mal.
Antigos alquimistas chineses
preparavam poções de chumbo ou mercúrio
para os seus aristocráticos patronos
que acreditavam que beber esses metais
os ajudariam a viver eternamente.
Em vez disso, essas poções matava-os
ou faziam-nos enlouquecer.
Outra combinação mortífera era o enxofre
aquecido com um nitrato orgânico
encontrado no solo por toda a China,
conhecido por salitre.
Quando os alquimistas experimentaram
esta fórmula,
aquilo explodiu em chamas,
ferindo os alquimistas
(Explosão)
e incendiando o laboratório.
Desse desastre nasceu
uma mistura química sem igual.
Pode ter falhado enquanto
elixir da imortalidade,
mas iria provar
ser um potente agente de morte.
Este pergaminho budista chinês
datado de cerca de 950 d.C.
mostra demónios rodeando
um Buda sentado.
Um demónio segura naquilo a que os chineses
chamam um "huo quiang”, ou lança-chamas.
É a imagem mais antiga que se conhece
de uma arma
que usa a mistura mortífera
de salitre e enxofre,
conhecida na História por pólvora.
No início do século XIII,
os Mongóis atacaram a Dinastia Jin da China.
O exército da Dinastia Jin contra-atacou
com bombas explosivas de pólvora.
Mas os Mongóis conquistaram
cada vez mais pedaços da China.
A artilharia chinesa reuniu os seus exércitos
e marchou para Ocidente, levando
as suas armas com pólvora.
Os Mongóis atacaram
cidades russas e polacas
com bombas de fogo explosivas.
E os europeus descobriram
o que a pólvora podia fazer.
No final do século XIII,
a fórmula para a pólvora
chegara à Inglaterra
e os europeus andavam a inventar
as suas versões das novas armas.
Não demorou muito até essa invenção
chinesa mudar a História europeia.
A 26 de agosto de 1346,
perto da aldeia de Crécy,
no norte da França,
os exércitos da França e da Inglaterra
preparavam-se para a batalha.
Montados nos seus corcéis de guerra,
envoltos nas suas armaduras,
a flor da nobreza francesa
formaram em linha de batalha,
enquanto os ingleses utilizavam
uma força muito diferente,
milhares de arqueiros especializados.
Os franceses enviaram os seus besteiros
genoveses para atacar os ingleses,
antes de os cavaleiros franceses
os aniquilarem.
Mas o rei inglês, Eduardo III,
passara anos a treinar os seus homens
de arco longo.
E todo esse treino estava prestes a ser recompensado.
Nada como aquilo já fora visto
num campo de batalha ocidental.
A primeira vez que uma saraivada de flechas
fosse disparada pelos arqueiros de Crécy
teria representado uma coisa totalmente nova
para muitos do exército francês que observavam.
Uma nuvem de flechas a descer na direção deles.
Devia ser assustador.
E, claro, o efeito foi quase imediato.
Sob a chuva das flechas inglesas,
os genoveses viraram as costas e fugiram,
e, segundo os relatos medievais da batalha,
também ficaram em pânico
por causa de outra arma inglesa.
Giovanni Villani escreveu,
muito pouco tempo depois da batalha,
na sua crónica, que o barulho
criado pelas armas
era tão forte e intimidante
que eles pensaram que Deus
estava a trovejar,
"As armas inglesas lançam bolas de ferro
por meio do fogo.
"Fazem um barulho como trovões
"e causam muitas baixas em homens e cavalos."
Um barulho como aquele
não tinha precedentes
para os soldados no campo da batalha.
Nada, na vida deles,
os tinha preparado
para um estrondo daquela dimensão.
e acompanhado por fumo
e por um forte cheiro a enxofre,
que ficava a pairar no ar.
Só puderam avaliar o impacto
quando os homens à volta começaram a cair.
Nem mesmo os soldados profissionais
como os genoveses
podiam esperar uma coisa
como aquela.
Devia ser uma coisa terrível
e não admira que eles
se espalhassem e fugissem.
Viraram costas e fugiram perante
a iminente carga de cavalaria frncesa.
A cavalaria francesa estava
a avançar para o campo da batalha
e ficaram estupefactos
ao verem fugir
as pessoas que tinham contratado.
Amaldiçoaram-nos e atacaram-nos.
e caíram tantos genoveses
sob os cascos franceses
como tinham caído sob as flechas
e as armas inglesas.
Todos os 12 000 cavaleiros franceses
— o dobro do exército inglês —
avançaram na carga contra os ingleses.
Também eles caíram sob
as flechas e s balas dos ingleses.
Carregaram vezes sem conta,,
carregaram 15, 16 vezes,
Os cavalos ficaram despedaçados
e os homens foram cuspidos dos cvalos.
E os que não foram cuspidos
foram atacados pelos homens de punhal
que acabaram com esses cavaleiros.
Foi um momento na História
em que o mundo mudou.
Significou o início do fim
do cavaleiro medieval.
A batalha de Crécy
ficou registada na História
como um dos primeiros usos
de armas a pólvora
numa batalha europeia.
Uns 500 anos depois
de ter incendiado a oficina
de um alquimista chinês,
a pólvora tonou-se a arma de eleição do destino.
Depois de Crécy, foi uma questão de tempo
até os destinos de povos e de nações
serem decididos pelas espingardas.
Ao fim de 200 anos,
os europeus usariam as suas poderosas
arms alimentadas por pólvora
para dominar o mundo,
criando impérios que evoluiriam
na cultura comercial global atual,
que liga os povos
através do comércio em vez das armas.
Mas, antes de a Europa poder embarcar
na sua aventura de criação de impérios,
a sua ordem social medieval
seria estilhaçada
por um acontecimento catastrófico,
que forjaria uma nova Europa
num cadinho de horror.
Enquanto os canhões troavam em Crécy,
havia outra coisa a espalhar-se
ao longo das rotas comerciais da Eurásia,
uma coisa que iria matar
dezenas de milhões de europeus.
Uma destruição apocalíptica da vida humana
que iria instituir os fundamentos
do mundo moderno.
Na batalha de Crécy de 1346,
os ingleses ganharam uma vitória
história sobre a França,
ajudados por uma invenção chinesa
que viajara até à Europa.
A pólvora.
Nesse mesmo ano de 1346,
a cerca de 2000 quilómetros a leste de Crécy,
ocorria outra batalha nas praias
do Mar Negro.
Um exército mongol tinha montado cerco
à cidade portuária de Caffa, na Crimeia,
um posto comercial da Rota da Seda
pertencente à cidade italiana de Génova.
Os mongóis eram mestres
da guerra por cerco.
Mas Caffa continuava a aguentar-se
depois de mais de dois anos.
Subitamente,
o exército mongol foi dizimado.
Não pelos defensores de Caffa,
mas por uma doença desconhecida.
Os mongóis rapidamente terminaram o cerco.
Mas antes de abandonarem Caffa,
carregaram as máquinas dp cerco
com os cadáveres dos seus mortos
e projetaram-nos para dentro
das muralhas da cidade,
na crença de que o fedor da morte
matasse os defensores.
As crónicas medievais dizem
que os defensores de Caffa
morreram aos milhares
mas não por causa do cheiro da morte.
Um ano depois, em 1347,
a mesma doença que matara
os mongóis em Caffa
estava a matar pessoas em Constantinopla.
Em 1348, estava a matar pessoas
por toda a Europa ocidental.
Em 1350, estava a matar pessoas
na distante Groenlândia.
Os europeus, aterrorizados,
deram-lhe um nome.
A Peste Negra.
Apenas em 10 anos, de 1347 a 1356,
a Peste Negra matara pelo menos
25 milhões de europeus,
um terço da população europeia.
Hoje, muitos estudiosos cham
que a Peste Negra foi um surto
da peste bubónica
que se transmitia aos seres humanos
através de pulgas infetadas que viviam nos ratos.
E pensamos que se espalhou pela Eurásia
à boleia dos exércitos, dos navios
e ds caravanas
ao longo das rotas comerciais
que já eram antigas
na altura da Peste Negra.
Micro-organismos viajantes de todos os tipos
movimentavam-se pela Eurásia
durante milhares de anos.
Uma bio-migração que teve
um tão grande impacto na história
como as trocas mais famosas
de novas tecnologias e de bens de luxo.
Como recentes descobertas mostram
pequenos seres vivos
movimentando-se ao longo da Rota da Seda
deram origem a vida, mas também a morte.
Estamos usar novos métodos
de analisar a agricultura primitiva
e, para isso, precisamos de analisar
todas as descobertas dos cultivos
primitivos na Europa.
Quando olhamos para um mapa
de toda a Europa,
vemos que havia estas culturas chinesas
em pequeno número,
muito cedo na Europa.
"Muito cedo" era por volta de 2000 a.C.
quando um grão chinês
chamado painço de milho
parece no registo arqueológico
da Europa de leste.