Em 1990, viajei à África do Sul a trabalho, pela Outward Bound. Aquela viagem mudou a minha vida. Nelson Mandela havia deixado a prisão poucos meses antes, e o aparheid estava chegando ao fim. Trabalhei com grupos de mineradores, bancos e outros tipos de empresas coordenando cursos de consolidação de equipes inter-raciais, todos com duração de oito dias. Os mineradores todos trabalhavam juntos nos mesmos turnos, mas, apesar disso, brancos e negros nunca comiam suas refeições juntos, nunca dormiam no mesmo alojamento e nunca bebiam cerveja juntos. A esposa de um dos mineiros disse: "Se dormir no mesmo quarto com um negro, me divorcio de você". Demos início a intensas atividades de equipe assim que eles chegaram. De início, fiquei empolgado e conectado com os mineradores negros de diferentes grupos tribais, que sempre cantavam e dançavam espontaneamente em volta da fogueira. Com o tempo, descobri que também tinha muito em comum com os brancos. Eram bons homens numa conversa a dois, mas faziam parte de um sistema opressor. Eles estavam em posição de poder, e os demais se submetiam a eles. Descobri com o tempo que eu tinha mais em comum com os homens brancos do que gostaria. Eu via a mim mesmo ao olhá-los nos olhos. Me senti na obrigação de voltar aos EUA e trabalhar com pessoas como eu, outros homens brancos. De volta aos EUA, passei sete anos pesquisando: como os homens brancos aprendem sobre diversidade? O que desperta nossa consciência e nossa atitude de forma a nos tornamos defensores da diversidade? Em minha pesquisa de dissertação, vi que os homens brancos que estudei aprendem quase tudo com mulheres e pessoas negras. Eles não recorrem a outros homens brancos, e se distanciavam de outros homens brancos e tinham raiva deles. Apresentei esses resultados numa conferência nacional, e uma mulher negra se levantou e disse: "Se o caminho para a diversidade para homens brancos é esse, eu cansei". (Risos) "Não tenho paciência para ensinar todos vocês". (Risos) E ela estava certa! Um colega meu que também trabalhava para a Outward Bound, Bill Proudman, teve uma ideia para quebrar esse padrão. Ele disse: "Vamos entrar numa sala com um grupo de homens brancos e passar quatro dias refletindo sobre nós mesmos. O que significa ser branco e ser homem, e, no caso de muitos de nós, heterossexual? Chamamos aquilo de convenção de homens brancos. A primeira convenção de homens brancos que fizemos foi há 20 anos. Desde então, já realizamos centenas delas, com milhares de homens brancos. Com o tempo, descobrimos que os homens brancos desconhecem três coisas. Primeiro, não sabemos que fazemos parte de um grupo e que temos uma cultura. Segundo, não sabemos que os outros vivem realidades diferentes da nossa no mundo. E terceiro, não sabemos que o processo de descobrir isso, na verdade, transforma a nossa vida, e que ganhamos muito nesse processo. Só pra deixar claro, os homens brancos não são os únicos no mundo que desconhecem coisas. (Risos) Todos temos coisas a aprender e a fazer no que diz respeito a nos relacionarmos melhor uns com os outros. Só que hoje vou falar sobre a parte que tange aos homens brancos, que geralmente não é tratada. Vamos voltar à primeira coisa que os homens brancos desconhecem. Não sabemos que fazemos parte de um grupo e que temos uma cultura. Quando me olho no espelho, eu vejo o Michael. Não me vejo como um homem branco. Os outros, mulheres e negros, talvez vejam um homem branco, mas eu só vejo o Michael. Isso é em parte devido à forma como a diversidade é encarada. Quando pensamos em raça, por exemplo, geralmente focamos pessoas negras. Quando pensamos em gênero, sobre quem normalmente falamos? Mulheres. Quando pensamos em orientação sexual, geralmente focamos gays, lésbicas e bissexuais. Não pensamos em como é ser branco, ser homem ou ser heterossexual. É como uma parte invisível de mim. Uma vez trabalhei com o líder de uma equipe SWAT, que disse que aplicou o que aprendeu logo no primeiro dia de volta ao trabalho. Ele estava numa situação que normalmente termina numa briga ou em cana, e ele conseguiu evitar ambos. Se enxergando e se reconhecendo como homem branco, ele percebeu: "Essa pessoa não me conhece". Ele entendeu que não tinha que levar para o pessoal. Ele passou da defensiva para a reflexão, e conseguiu transformar uma situação explosiva numa situação de parceria. Nós, homens brancos, não sabemos que pertencemos a um grupo nem que temos uma cultura. Somos como um peixe na água. Dificilmente temos que sair da nossa água cultural e, por isso, somos os que têm menos consciência dela. A cultura, a nossa cultura, permeia nossas escolas, instituições, a Igreja, os negócios, a maioria dos lugares que frequentamos. Então, somos os que têm menos consciência dela. Eu adoro minha cultura, e aprendi a enxergar que, quando me utilizo demais da força dela, essa força pode se tornar fraqueza. Quais são algumas das características da cultura branca masculina? Uma delas é o individualismo. Eu adoro esse meu lado. Adoro me levantar, colocar minhas botas, baixar minha cabeça e trabalhar duro. Tem funcionado muito bem pra mim. Sei que posso me utilizar demais disso, assim como os outros também. Já ouviram falar de homens brancos que se perdem e se recusam a pedir ajuda a alguém na rua? Membro da plateia: Meu pai! Michael Welp: Recentemente? (Risos) Estou fazendo um manual sobre homens brancos, vocês podem ler as instruções aqui. Também adoro a disposição para a ação. Essa é outra característica da nossa cultura. E essa disposição para a ação tem a ver com fazer o que tem que ser feito. Gosto de consertar as coisas, gosto de resolver problemas. Também posso me valer demais dessa mentalidade de resolução de problemas. Alguém aqui já teve de dizer ao seu marido branco: "Não quero que resolva isso. Só quero que escute"? (Risos) Alguém já ouviu isso? Se você é homem e branco, já ouviu isso? Nossa cultura também nos ensina que não podemos ser racionais e emotivos ao mesmo tempo. Por isso deixamos de lado nossa emotividade. Outras culturas não fazem isso. Quando vivo nessa bolha cultural, que é invisível pra mim, sequer penso que seja uma cultura. Penso que sou um bom ser humano, um bom norte-americano. E julgo os outros a partir dessa bolha cultural invisível, e isso os coloca num lugar em que se sentem julgados. Preconceito inconsciente, é o que é pra mim, como se fosse um sistema operacional cultural em piloto automático que eu sequer sabia que rodava dentro de mim. Posso dizer que sou cego culturalmente, ou que sou cego em termos de gênero, e que simplesmente trato todos da mesma forma. Não percebo que os outros entendem isso como ter que se adaptar à minha bolha cultural. E sequer sei que estou causando essa imposição aos outros. Os outros podem ficar frustrados por saberem que precisam deixar parte de si do lado de fora da porta. E o mais interessante é que fazemos isso a nós mesmos como homens brancos. Também nos adequamos à bolha cultural e, ao fazermos isso, deixamos parte da nossa humanidade pra trás. A segunda coisa que a maioria dos homens brancos não sabe é que os outros vivenciam o mundo de forma diferente. A maioria de nós naturalmente se conecta com base em igualdade e semelhança. Na verdade, pesquisas interculturais mostram que, no que tange a diferenças, a maioria das pessoas ou negam ou minimizam essas diferenças, e esse padrão aparece em gerações mais novas também. Mesmo assim, mulheres, negros e outros vivem realidades diferentes e, se só me conecto com base na semelhança, não enxergo outras partes da realidade deles. Não é que a minha visão de mundo seja errada; na verdade, ela é incompleta. Então, por exemplo, não preciso pensar na minha própria segurança. Se saio para correr à noite, geralmente me sinto tranquilo, mesmo sozinho. Viajo muito a trabalho. Chego tarde em aeroportos e vou dirigindo até o hotel. Às vezes, eu me perco. Mas não me preocupo muito. Só não é fácil, mas não é perigoso pra mim, geralmente. Muitas mulheres iriam preferir chegar ao hotel antes de escurecer e que seu quarto não fosse no andar térreo ou próximo a uma saída. Eu estava viajando com meu colega de trabalho, Bill, para Kalamazoo, Michigan, para trabalhar com um grupo de executivos. Bem, assim que meu voo chegou ao Aeroporto O'Hare, ele fechou por causa de tempestades. Logo descobri que não havia mais voos para Kalamazoo e que não havia mais carros para alugar. O individualismo de Bill entrou em ação e ele convenceu um taxista a nos levar até Kalamazoo. Chegamos lá às 2:30 da manhã e, às 8h, estávamos orgulhosos diante da equipe de executivos, falando sobre como foi nossa aventura para chegarmos ali. Falhar não era uma opção nesse individualismo. Bem, havia uma mulher naquele grupo. Ela levantou a mão e disse: "Eu jamais teria entrado nesse táxi e viajado pelo interior dos EUA à noite com um taxista desconhecido. Eu teria dado uma desculpa para que vocês não achassem que deixei a equipe na mão". Eu olhei pra ela, pro Bill e pro grupo, e disse: "Eu dou esses cursos, mas nunca me dei conta dessa realidade". A palavra "privilégio" é difícil pra nós, homens brancos, porque não nos sentimos privilegiados. Na verdade, achamos que trabalhamos muito duro por tudo que temos. Eu diria que, analisando bem, sim, trabalhamos muito duro, e há coisas pelas quais não tivemos que passar ou tolerar ou imaginar e que outros grupos têm. Vou dar alguns exemplos de como minha vida talvez seja diferente por ser heterossexual. No trabalho, posso colocar um retrato de quem amo na mesa sem me preocupar com o que os outros vão pensar, nem me preocupar que isso possa prejudicar minha próxima promoção ou meu emprego. Como cisgênero, posso sair com amigos pra qualquer lugar e saber que vou encontrar um banheiro que vou poder usar sem ser constrangido ou agredido. Como branco, no trabalho as pessoas não me olham pensando que fui contratado através de programas de cotas, me fazendo sentir que preciso trabalhar o dobro para provar que sou qualificado. Posso facilmente achar mentores brancos em todos os níveis na maioria das empresas. Posso comprar quadros, cartões postais e de Natal mostrando pessoas brancas, facilmente. Não preciso ter aquela conversa com meus filhos brancos sobre como literalmente permanecer vivo quando parados pela polícia. Então, pra mim, as camadas de privilégio se acumulam. Por não ter deficiências, pelo menos não até o momento, não precisei me preocupar com como chegar aqui pra dar esta palestra. Como cristão, todos conhecem meus feriados religiosos, e ajustam suas agendas a eles. Então, o privilégio é algo em que não preciso pensar. Não preciso lidar ou passar por algumas dessas situações. E isso não é algo que escolhi. O que acontece é que os outros acham que nós, homens brancos, conhecemos nossos privilégios, que os enxergamos. As pessoas acham que não nos importamos ou que queremos manter nosso privilégio. Elas acreditam que há má intenção associada a esse privilégio. Quando começamos a enxergar e a aceitar o nosso privilégio, isso retira o fardo dos outros de ter de nos ensinar e provar para nós que suas realidades diferentes são reais. Posso usar o meu privilégio para o bem. Por exemplo, se numa reunião uma mulher expuser uma ideia, for ignorada e alguns minutos depois um homem repetir a mesma ideia, posso usar o meu privilégio para apontar aos meus colegas que, ei, a ideia foi dela. Se ela fosse fazer isso, talvez fosse vista como implicante em relação aos homens. Quando reconhecemos como válidas as realidades das outras pessoas e permitimos que nosso coração seja impactado por essas realidades, geramos mais confiança e mais abertura. Vi isso acontecer na África do Sul, e vi acontecer no mundo todo. É uma mudança de uma parceria baseada parcialmente no medo para uma parceria baseada mais no amor. Isso me leva à terceira coisa que a maioria dos homens brancos desconhece. Achamos que diversidade tem a ver com ajudar os outros com seus problemas. Não percebemos que o processo de aprendermos sobre nossa cultura e o fato de os outros vivenciarem uma realidade diferente na verdade é transformador pra nós e nos dá muitas possibilidades. Por exemplo, quando me dou conta da minha bolha cultural, posso continuar a usar a força da minha cultura e tenho a opção de sair dessa cultura quando isso for melhor para mim e para os outros. Por exemplo, talvez eu queira usar minha mente e meu coração ao mesmo tempo. Talvez eu queira conseguir pedir ajuda quando estou perdido, ou dizer: "Eu não sei". Talvez eu queira conseguir maneirar e não tentar resolver algo que eu não entenda. Quando mostro que estou disposto a entender as realidades dos outros, isso abre espaço para novas parcerias. Um homem branco voltou do curso, falou com um homem negro no trabalho e compartilhou o que aprendeu. No início, o homem negro não quis conversa. Uma semana depois, o homem negro procurou o homem branco, fecharam a porta, conversaram por duas horas, e ele disse: "Em 20 anos, nenhum homem branco jamais me perguntou como é ser negro nesta empresa". Outro homem branco voltou do curso e pediu desculpas a seu filho. Uma semana antes da convenção, o filho dele havia voltado da escola após sofrer bullying, e o pai disse a ele: "Não chore. Engula o choro". Bem, durante a convenção, o homem branco descobriu que estava treinando o filho pra viver na bolha de homem branco. Ele voltou pra casa e disse: "Me desculpe por ter dito pra engolir. Tudo bem sentir o que você sente, e você não precisa fazer isso sozinho. Pode me procurar, e eu vou te apoiar". Podemos ter outros tipos de parcerias no trabalho também. Se eu ofendo alguém, o que vai acontecer inevitavelmente, não preciso perder tempo defendendo que sou bacana. Posso mudar, com humildade e reflexão, e dizer: "Como foi que afetei você?" Isso me faz passar de uma posição de "não é minha culpa" para uma posição de "assumo a responsabilidade". Então, homens brancos, o que vocês podem fazer quando saírem daqui? Primeiro, percebam e lembrem-se de que vocês têm uma cultura e podem começar a enxergá-la. Podem sair dela quando isso for necessário, e podem perceber melhor quando a estão impondo aos outros. Segundo, lembrem-se de que os outros vivem realidades diferentes das suas. Usem da reflexão e da curiosidade para entender o mundo deles e ampliar os seus próprios horizontes. Três anos antes de Nelson Mandela morrer, escrevi uma carta pra ele. Nela, eu disse: "Fiquei admirado ao ver você, depois de 27 anos na prisão, abraçar, numa atitude de amor, os homens brancos que o aprisionaram. Você mostrou que o amor é a maior força de transformação, e quero que você saiba que a atitude de amor que carrego é a mesma que você demonstrou aos homens brancos na África do Sul". Peço que todos vocês aqui mostrem essa atitude aos outros e criem parcerias extraordinárias com pessoas em todo o mundo. Obrigado. (Aplausos) (Vivas)