O que aprendi sobre o medo quando fiz ilustrações da obra de Edgar Allan Poe | Eric Mongeon | TEDxBoston
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0:09 - 0:11["Antes de tudo, desmembrei o cadáver.
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0:11 - 0:13Separei a cabeça,
os braços e as pernas."] -
0:13 - 0:15Eu li essas palavras quando tinha 15 anos,
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0:16 - 0:17na escola.
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0:19 - 0:22Como a maioria, eu agradeço
ao professor de literatura -
0:22 - 0:23por me apresentar
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0:23 - 0:27ao mundo assustador e sombrio
de Edgar Allan Poe. -
0:28 - 0:30No nono ano, na aula de inglês,
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0:30 - 0:32lemos "O Coração Delator".
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0:32 - 0:37Uma história tão assustadora
quanto os quadrinhos que eu lia. -
0:37 - 0:40Era tão perturbadora
quanto os filmes que eu assistia. -
0:40 - 0:43Era uma história sancionada
pelos meus professores, -
0:43 - 0:45que me assustou,
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0:45 - 0:47e fazia parte da lição de casa.
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0:50 - 0:51Agora, o problema é
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0:51 - 0:54que fomos ensinados a ler
com um propósito -
0:54 - 0:56como para ir bem num teste,
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0:56 - 0:58e quando você está lendo para isso,
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0:58 - 1:00a leitura tende a se tornar desmotivada.
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1:00 - 1:04A história começa a se tornar
algo em que você reflete sobre -
1:04 - 1:07em vez de se deixar levar.
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1:08 - 1:09E vamos ser sinceros,
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1:09 - 1:10você nunca vai sentir medo
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1:10 - 1:13de algo com o que você
não consiga se envolver. -
1:13 - 1:15Então minha imagem do Poe partiu disso
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1:16 - 1:18para algo mais ou menos assim.
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1:18 - 1:19(Risos)
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1:19 - 1:21Eu encontraria o Poe
em outras aulas de literatura -
1:21 - 1:22durante o ensino médio,
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1:22 - 1:26mas nunca o veria
além de uma tarefa de escola. -
1:26 - 1:28A empolgação se foi,
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1:28 - 1:31e voltei para os meus quadrinhos
e filmes alternativos de terror. -
1:33 - 1:35Até que entrei na escola de arte
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1:35 - 1:39em busca de material sensacionalista
para adaptá-lo a um romance gráfico. -
1:39 - 1:40Agora, meus interesses
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1:40 - 1:43ainda se mantém na mesma área básica
do espectro da cultura "pop". -
1:43 - 1:47E meio que me tornei
um conhecedor exigente. -
1:48 - 1:50Mas decidi dar ao Poe uma nova chance,
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1:50 - 1:53e fiquei chocado com o que descobri.
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1:54 - 1:56Meus professores estavam
totalmente certos: -
1:56 - 1:58isso é literatura de primeira classe,
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1:58 - 2:03cheia de comunicação sofisticada,
um ritmo perspicaz e reflexões profundas, -
2:03 - 2:04mas também tão cheia
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2:04 - 2:09de ação emocionante, violência
perturbadora e desordem inspiradora. -
2:09 - 2:14Se o melhor da cultura pop
é ao mesmo tempo erudito e popular, -
2:15 - 2:17então isso é cultura pop
da melhor qualidade. -
2:17 - 2:20Eu decidi fazer uma adaptação
que faria jus a isso. -
2:20 - 2:23Eu queria dar um tratamento
que celebraria os aspectos eruditos -
2:23 - 2:26e ao mesmo tempo revelando
os aspectos populares. -
2:27 - 2:30Tinha feito quatro páginas
antes de me formar. -
2:31 - 2:33Mas acabei voltando ao Poe
com o passar dos anos, -
2:33 - 2:37sempre surpreso com o quanto sentia
falta desde a última vez que o li. -
2:37 - 2:38Ele foi um dos primeiros
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2:38 - 2:41a escrever sobre o medo
de forma ímpar e moderna. -
2:41 - 2:42Sua produção foi na década de 1830,
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2:42 - 2:46bem no auge da segunda fase
da Revolução Industrial. -
2:46 - 2:48Foi um período na cultura norte-americana
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2:48 - 2:49em que se tinha muita fé
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2:49 - 2:54na destreza racional para nos libertar
de medos e superstições. -
2:54 - 2:57Reflexões intelectuais,
então a história segue, -
2:57 - 2:59vão trazer uma imagem da realidade,
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2:59 - 3:04a qual você pode usar como ferramenta
para prever e entender o mundo. -
3:04 - 3:06Agora, isso funciona bem,
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3:06 - 3:07exceto quando não funciona,
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3:07 - 3:09isso é o que o Poe escreve.
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3:10 - 3:13Todos os personagens
de Poe experienciam o medo, -
3:13 - 3:15quando suas crenças fundamentais
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3:15 - 3:18em relação à situação social,
pessoal ou prática -
3:18 - 3:20são de certa forma invalidadas.
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3:22 - 3:24O mundo se torna incerto
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3:24 - 3:26porque a imagem da realidade
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3:26 - 3:28não bate com a experiência da realidade.
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3:30 - 3:34Ele entendia que a base do medo,
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3:34 - 3:35é a incerteza;
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3:35 - 3:38e que não tem a ver com o que não sabemos.
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3:38 - 3:40E isso faz sentido
quando pensamos a respeito. -
3:41 - 3:42Uma coisa é
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3:42 - 3:45saber que há um assassino
escondido no seu guarda-roupa, -
3:45 - 3:46mas outra completamente diferente
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3:46 - 3:48é se perguntar se aquele som,
que você ouviu, -
3:48 - 3:51é de um assassino
escondido no guarda-roupa. -
3:51 - 3:52(Risos)
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3:57 - 4:01Todos os personagens de Poe
tentam lidar com esse tipo de medo, -
4:01 - 4:02a maioria fazendo a mesma coisa:
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4:02 - 4:04eles tentam manter
essa imagem da realidade -
4:04 - 4:09ao forçar suas circunstâncias
a se enquadrarem naquela imagem. -
4:09 - 4:12Agora, isso normalmente traz
consequências terríveis. -
4:12 - 4:15As pessoas acabam
condenando umas as outras, -
4:15 - 4:16machucando outras;
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4:16 - 4:18elas acabam cavando covas.
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4:18 - 4:21Ou seja, isso é um excelente
material para ilustrações. -
4:24 - 4:26Então, 15 anos depois,
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4:26 - 4:28eu ainda não tinha feito
nenhum avanço no meu acervo. -
4:32 - 4:37Eu passei por uma prateleira
cheia de livros do Poe e a respeito dele. -
4:37 - 4:41Eu juntei uma pilha de esboços
e estudos sobre técnicas de narração. -
4:41 - 4:44Eu até estudei o estilo
de design da época do Poe, -
4:44 - 4:48mas sequer estava perto
de criar meu acervo. -
4:48 - 4:50Estava preso em um padrão
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4:50 - 4:52que acho que vários
profissionais criativos vão reconhecer. -
4:53 - 4:55Vamos chamar isso de "Vortex".
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4:55 - 4:59É um círculo vicioso de pesquisa,
rejeição e requinte. -
4:59 - 5:03É incessante e autoperpetuante
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5:03 - 5:06porque você sente
que está de fato fazendo algo. -
5:06 - 5:07(Risos)
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5:08 - 5:10Você coleta novas informações,
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5:10 - 5:11descarta informações antigas,
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5:11 - 5:13refaz seu plano.
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5:13 - 5:16Você está trabalhando
constantemente no projeto. -
5:17 - 5:20Exceto que tentar
não é a mesma coisa que fazer. -
5:29 - 5:33Eu percebi que isso se tornou uma forma
implícita de justificativa para fazer. -
5:34 - 5:36Eu estava com medo
de realmente fazer o trabalho -
5:37 - 5:40porque tinha medo
do risco de fazê-lo errado. -
5:40 - 5:42Porque também tinha
uma imagem da realidade, -
5:42 - 5:44e a imagem da realidade
incluía uma imagem de mim -
5:44 - 5:46como a pessoa que não pode
interpretar mal o Poe. -
5:47 - 5:49Eu estava me escondendo na lição de casa.
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5:50 - 5:51E quando me dei conta disso,
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5:51 - 5:54eu parei de tentar e me ocupei em fazer.
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5:54 - 5:55Comecei a fazer os desenhos.
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5:56 - 5:57Comecei a fazer os leiautes.
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5:57 - 5:59A ansiedade ainda não tinha passado,
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6:00 - 6:03mas não estava mais
me interrompendo de fazer o trabalho. -
6:03 - 6:06Ainda não havia garantias
de que faria a coisa certa, -
6:07 - 6:08mas eu estava fazendo.
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6:10 - 6:13Eu olhei para trás
nesses 15 anos de pesquisas, -
6:13 - 6:14estando preso no Vortex,
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6:14 - 6:18e percebi que estava num prolongado
mecanismo de enfrentamento. -
6:18 - 6:22Eu estava numa tentativa de proteger
minha imagem da realidade -
6:22 - 6:25ao lançar um tipo de ataque
preventivo contra a incerteza. -
6:26 - 6:27E pensava assim:
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6:27 - 6:30"Se você nunca colocar sua imagem
da realidade em teste, -
6:30 - 6:33você nunca correrá
o risco dela ser invalidada". -
6:34 - 6:36Mas como diz o ditado,
-
6:36 - 6:38"quem não arrisca não petisca".
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6:41 - 6:44Então, ainda estava de frente
com um problema prático. -
6:44 - 6:46Como eu consigo tirar
meu trabalho do papel? -
6:49 - 6:51[O comércio é assustador]
-
6:51 - 6:54Enquanto eu estava estancado no Vortex,
-
6:54 - 6:56eu estava me prendendo a uma certa imagem
-
6:56 - 6:59de como a edição especial
supostamente deveria ser. -
6:59 - 7:02O livro deveria ter capa dura
e encadernação em couro. -
7:02 - 7:04Deveria ser impresso em papel feito a mão.
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7:05 - 7:09Realmente, uma linda edição
para colecionadores refinados -
7:09 - 7:12que estão procurando um antídoto
contra a mídia digital. -
7:13 - 7:15Eu não tinha o dinheiro
para pagar esse nível de produção. -
7:16 - 7:17Tinha um trabalho assalariado,
-
7:17 - 7:21então eu nem sabia se teria tempo
de coordenar esse tipo de produção. -
7:21 - 7:23Eu estava contando sobre isso a um amigo
-
7:23 - 7:25durante um café,
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7:25 - 7:27e recordávamos sobre colecionar
revistas em quadrinhos, -
7:27 - 7:31e me lembrei da empolgação que sentia
-
7:31 - 7:33sempre que a nova edição
do "O Espetacular Homem-Aranha" -
7:33 - 7:36aparecia inesperadamente
na minha caixa de correspondência. -
7:36 - 7:38Então ele me disse:
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7:38 - 7:41"Por que seu projeto sobre o Poe
tem que ser uma edição especial? -
7:41 - 7:44Por que não o separar
em histórias individuais -
7:44 - 7:46e vender assinaturas
-
7:46 - 7:48como num gibi ou revista?"
-
7:48 - 7:50E isso fez um certo sentido.
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7:50 - 7:54Ou seja, por que uma edição especial
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7:54 - 7:55tinha de ser substancial?
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7:55 - 7:59Por que não poderia ser quebrada
em periódicos colecionáveis? -
7:59 - 8:02Isso fazia sentido, pois o Poe
não escrevia para edições especiais. -
8:02 - 8:04Os trabalhos dele apareciam em revistas.
-
8:05 - 8:07Isso fazia sentido prático
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8:07 - 8:09porque eu poderia vender assinaturas
-
8:09 - 8:13para poder levantar o dinheiro
que precisava para iniciar o projeto. -
8:15 - 8:17Então eu fiz um site,
-
8:17 - 8:19um tipo de visão geral do projeto.
-
8:19 - 8:23Incluía uma página que permitia as pessoas
a pagar pela assinatura via PayPal. -
8:24 - 8:25Eu faria quatro histórias,
-
8:25 - 8:28o design e ilustraria
cada uma individualmente, -
8:28 - 8:32enviaria um a cada 12 semanas
no período de um ano. -
8:32 - 8:36Os assinantes não saberiam exatamente
quando a nova edição chegaria, -
8:36 - 8:39e eu não diria quais quatro
histórias eu iria fazer. -
8:40 - 8:42Com sorte, eles ficariam ansiosos
-
8:42 - 8:46quando o novo volume inesperadamente
chegasse na sua caixa de correspondência. -
8:46 - 8:48Agora, o projeto foi parar
-
8:48 - 8:49no "Boing Boing",
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8:49 - 8:53e que me foi dito que tem leitores
rivais do "thenewyorktimes.com", -
8:53 - 8:54(Risos)
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8:54 - 8:57e, bem, adivinhe o mês...
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8:57 - 9:00isso é um gráfico de tráfego
no meu site... -
9:00 - 9:03adivinhem em qual mês
eu vi a postagem no Boing Boing? -
9:04 - 9:05Muita gente do Boing Boing,
-
9:05 - 9:09compartilhou no Twitter
e no Facebook, postou em blogs. -
9:09 - 9:11A notícia se espalhou
e, no final da primeira semana, -
9:11 - 9:15eu tinha arrecadado dinheiro suficiente
para produzir meu primeiro volume. -
9:15 - 9:16Que ótimo!
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9:16 - 9:18Agora tem gente pagando por isso,
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9:18 - 9:19tenho essa responsabilidade.
-
9:19 - 9:21Eu tive que produzir.
-
9:21 - 9:23Porque senão, eu perderei a chance
-
9:23 - 9:26e não seria apenas vergonhoso;
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9:26 - 9:28passaria a ser fraude, então.
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9:28 - 9:29(Risos)
-
9:36 - 9:40Mas nada disso teria acontecido
se eu tivesse me prendido àquela imagem -
9:40 - 9:43do que uma edição especial
supostamente deveria ser. -
9:43 - 9:44Teria perdido toda a chance
-
9:44 - 9:48das possibilidades na internet
e nas conexões das redes sociais, -
9:48 - 9:51e essa edição nunca teria acontecido.
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9:53 - 9:57É fácil fugir do medo quando você
não é responsabilizado por ninguém, -
9:57 - 10:00e outras pessoas tomam
responsabilidade do seu trabalho. -
10:00 - 10:04Seus amigos, sua família,
clientes, colegas... -
10:04 - 10:06é o envolvimento deles
-
10:06 - 10:07que te encoraja,
-
10:07 - 10:10ou te traz
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10:10 - 10:15o motivo para lidar com o medo
que, de outra forma, te atrapalharia -
10:15 - 10:18de realmente fazer o trabalho.
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10:18 - 10:21Mas muito antes
de alguém se responsabilizar, -
10:21 - 10:23você tem uma decisão simples a fazer.
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10:23 - 10:26Que é a escolha
entre a certeza e a incerteza. -
10:26 - 10:29Você pode decidir entre dar
o seu melhor no trabalho -
10:29 - 10:31e correr o risco
de que isso não te faça feliz, -
10:32 - 10:35ou decidir em não dar o seu melhor
-
10:36 - 10:39e ter a certeza
que ele não vai te fazer feliz. -
10:40 - 10:44Eis então um caso de que um caminho
incerto é o mais atrativo, -
10:44 - 10:47e acredito que o Poe iria gostar disso.
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10:47 - 10:49Obrigado pela atenção.
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10:49 - 10:50(Aplausos)
- Title:
- O que aprendi sobre o medo quando fiz ilustrações da obra de Edgar Allan Poe | Eric Mongeon | TEDxBoston
- Description:
-
Eric Mongeon mistura o erudito e o popular para vencer o medo do desconhecido.
Eric Mongeon é um designer, ilustrador e diretor criativo, residente em Boston. Ele trabalha como diretor criativo na agência de mídia do MIT, a "MIT Technology Review", onde é responsável por definir a visão estratégica de design e a direção de todos os projetos de eventos, digitais e impressos. Anteriormente, ele foi o diretor criativo da revista "Boston" e operou um estúdio de design, trabalhando com clientes nas áreas de educação, tecnologia e cultura.
Esta palestra foi dada em um evento TEDx, que usa o formato de conferência TED, mas é organizado de forma independente por uma comunidade local. Para saber mais visite http://ted.com/tedx
- Video Language:
- English
- Team:
closed TED
- Project:
- TEDxTalks
- Duration:
- 10:58