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Bem-vindo a mais um episódio de...
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Bem-vindo a mais um episódio de Take Care of Your Belongings,
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um podcast sobre o transporte público.
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Inovação, progresso, vanguarda.
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A Uber lançou nos Estados Unidos um novo
produto chamado RootShare.
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Hum, RootShare.
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Estou mesmo a ver que é mais um daqueles
produtos inovadores e vanguardistas.
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Digam-me vocês,
o Uber RootShare é um serviço de transporte
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que percorre um caminho definido,
pode acomodar várias pessoas,
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aparece num sítio específico
de 20 em 20 minutos na hora de ponta
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e é mais barato do que um táxi,
ou seja, um autocarro.
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Então mas isso já existe!
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O quê? Estás a pôr em causa
o espírito inventivo da Uber?
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Meus amigos, o diretor de produto da Uber, Sachin Kansal,
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explicou como se utiliza esta absoluta novidade
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que rompe com tudo o que conhecíamos até hoje.
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Atenção que isto é absolutamente inovador.
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Posso ler as palavras do senhor?
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Amém, podes.
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Então é assim, funciona desta forma.
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Pedimos aos passageiros que caminhem em alguns quarteirões
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até um ponto previamente definido,
a uma hora previamente combinada
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para participarem numa rota previamente estabelecida
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que irão partilhar com mais alguns passageiros.
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Chamamos a isso RootShare.
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Não, não chamam isso RootShare,
chamam autocarro.
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Isto não é novo,
é só uma versão mais cara do transporte público.
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É um autocaro.
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Um autocaro?
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Um autocaro da Carricos.
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É um autocarro digital, não é um autocarro em que é preciso passe,
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sem um autocarro em que é preciso password.
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Isto já existe.
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De facto, isto não é bem uma novidade.
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É uma novidade de 1859,
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quando a mala aposta passou a fazer Porto-Lisboa em menos de 34 horas.
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A sério, o RootShare é um autocarro.
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Realmente o transporte público
tem tanta dificuldade em cumprir horários
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que até o futuro dos autocarros chega atrasado.
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Estás zangado com esta empresa por não ter inovado, Manuel?
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Um bocado, porque a minha pergunta é
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o que é que Silicon Valley tem contra autocarros?
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Parece que desde que apareceu a inteligência artificial,
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o objetivo das grandes tecnológicas
tem sido acabar com carreiras.
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Eu não sabia que isso incluía a carreira 782 para Buscavide.
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Eu percebo o que dizes,
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mas não poder escolher a hipótese deste serviço
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ser mais confortável do que um autocarro normal.
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Ah, mas isso é óbvio.
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Isso é óbvio o que vai acontecer.
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Se for como na Uber normal,
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uma viagem de Uber autocarro
vai começar por custar um euro e meio
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e és apanhado por uma vanda Mercedes
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daquelas luxuosas que transportam
comitivas diplomáticas do Qatar,
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a hóteis de cinco estrelas,
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com um motorista de facto da Rosa Teixeira
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que te leva garrafinhas de San Pellegrino
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e gomas ácidas ao assento.
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Mas depois vai descambar, é isso?
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Óbvio, óbvio.
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Três anos depois, quando a clientela já estiver fidelizada,
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o Uber autocarro vai custar 17 euros,
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sendo que te veem buscar numa carrinha de caixa aberta
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conduzida por um senhor de Mangacaba
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que se engana no caminho
porque está a ver CMTV no telemóvel
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enquanto conduz aos S's.
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Não é a primeira vez que o Silicon Valley inventa coisas que já existem.
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Por exemplo, em 2021, Elon Musk construiu um túnel para carros elétricos.
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Exato, um túnel para carros elétricos circularem em comboinho.
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Ou seja, um metro que é pior, mais caro
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e que transporta menos pessoas.
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Parem de inventar coisas já inventadas.
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O que é que segue?
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Vão criar o Uberfoot, em que uma pessoa paga para andar a pé...
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Não me parece que vai funcionar.
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Resulta, resulta. Já estou a imaginar a campanha Uberfoot,
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a nova forma de transporte mais saudável,
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com zero emissões, numa viagem cénica
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para desfrutar das paisagens da cidade.
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Queres beleia? Já chamei Uberfoot, estava com 30% de desconto.
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Não há qualquer vantagem em pagar para andar a pé, não é?
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É bom, Uberfoot é ótimo.
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É bom porque não tens de procurar o condutor na rua,
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que acontece com o Uber normal, no Uberfoot não.
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E leva-te mesmo ao sítio onde queres ir.
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Até porque pouca gente sabe disto, mas os carros não sobem escadas.
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Eu já andei várias vezes de Uberfoot
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e dei sempre 5 estrelas a mim próprio.
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Diz-me uma coisa, és um bom condutor de Uberfoot?
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Excelente condutor de Uberfoot.
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Mas atenção, se é para ser honesto,
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já houve situações em que eu preferia ter apanhado um Uberfoot.
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Tais como?
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Tais como, por exemplo, quando chamo um TVDE,
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e tenho de ser sincero,
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e me aparece um Fiat Panda.
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O TVDE Fiat Panda não tem nenhum benefício
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sem ser para quem tem saudades de viajar.
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É porque nos recordam dos carros que se alugam em Itália?
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Não, porque no Fiat Panda tanto o espaço exíguo
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que oferece para as pernas, como a impossibilidade de transportar uma mala
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nos fazem lembrar um voo da Ryanair.
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Acho que está a ser um bocado picuinha.
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Isto é capaz de ser bem pior para quem está a conduzir, não?
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Concordo contigo.
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É pior primeiro porque é desconfortável,
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depois porque há clientes que não deixam de ser uns mimadões insuportáveis
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só porque estão num carro minúsculo.
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É verdade, há malta que se acha da realeza.
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Querem ser tratados como se estivessem num Papa Móbil
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quando estão num Papa Reformas.
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Nem pensar nunca é na vida, esquece
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Não quero ouvir nem mais um podcast
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Logo no jingle sinto ódio
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Bem-vindo a mais um episódio de...
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Estava aqui a ver na internet...
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Trata-se de um autocarro.
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É um autocarro.
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É um autocarro.
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Alguém que lhes diga...
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Já existe.
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É uma carreira.