Great Art Cities: Roma - Caravaggio, Bernini e Pozzo
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0:11 - 0:13Roma é o berço do Barroco,
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0:13 - 0:17o estilo muito ornamentado e elaborado
da arquitetura, da arte e do design -
0:17 - 0:19que floresceu na Europa.
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0:19 - 0:21no século XVII e na primeira metade
do século XVIII. -
0:22 - 0:25Ao contrário do Renascimento,
com o controlo e o perfeito equilíbrio, -
0:25 - 0:28o barroco distinguiu-se
pelo toque dramático -
0:28 - 0:30e sentido de movimento.
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0:30 - 0:34O estilo barroco também
foi a primeira forma de arte global, -
0:34 - 0:38espalhando-se a partir de Roma
por toda a Europa e a Ásia. -
0:39 - 0:43O lado positivo da enorme riqueza
da Igreja Católica Romana -
0:43 - 0:46tem sido o seu apoio
a centenas de artistas, -
0:46 - 0:49incluindo os três
que vamos abordar neste vídeo: -
0:49 - 0:54Miguel Ângelo, Marisi de Caravaggio
Andrea Pozzo e Gian Lorenzo Bernini. -
0:57 - 1:02Neste episódio, Great Cities Explained
sai das galerias e dos museus -
1:02 - 1:04e entra em três igrejas barrocas
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1:04 - 1:08que ainda albergam hoje as suas obras
e podem ser visitadas de graça. -
1:31 - 1:35Caravaggio, Bernini e Pozzo
nasceram num mundo -
1:35 - 1:38que tinha sido abalado
pela Reforma Protestante -
1:38 - 1:40que tinha enfraquecido significativamente
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1:40 - 1:43a influência da Igreja Católica,
por toda a Europa. -
1:43 - 1:47A Reforma Protestante começou em 1517,
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1:47 - 1:51quando Martinho Lutero questionou
a igreja católica com as suas 95 teses, -
1:51 - 1:54criticando as indulgências
e a corrupção clerical. -
1:54 - 1:57Com base nas disputas
sobre salvação e escrituras, -
1:58 - 2:00alastrou pela Europa
através da imprensa -
2:00 - 2:02e através de outros reformadores.
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2:03 - 2:05O movimento fraturou o Cristianismo,
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2:05 - 2:08e acabou por dar origem
a guerras religiosas -
2:08 - 2:11e à reforma da paisagem
religiosa e política da Europa. -
2:11 - 2:15Uma das armas que a Igreja Católica
usou na luta contra o Protestantismo -
2:16 - 2:17foi a arte.
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2:17 - 2:20Uma coisa é a igreja dizer aos padres
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2:20 - 2:23o que devem ensinar e escrever
novas leis e novos decretos, -
2:23 - 2:26mas também tinham de transmitir
essas informações -
2:26 - 2:28às pessoas comuns da rua.
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2:28 - 2:33Para isso, colocavam essas ideias
no local que as pessoas conheciam melhor, -
2:34 - 2:37onde iam celebrar a sua fé
— nas paredes das igrejas. -
2:38 - 2:41O movimento da contra-reforma da igreja
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2:41 - 2:43exigia que se usasse a arte
como uma ferramenta -
2:43 - 2:45para inspirar a fé e a devoção,
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2:45 - 2:49e, mais importante ainda,
para se envolverem emocionalmente. -
2:49 - 2:53A igreja iria usar uma imagética poderosa
para reforçar a doutrina católica, -
2:53 - 2:57inspirar a fé e contrariar
a disseminação do Protestatismo. -
2:58 - 3:03Decretou que a arte devia ser clara,
direta, emotiva e didática, -
3:03 - 3:06transmitindo mensagens religiosas
-
3:06 - 3:10de forma acessível a toda a gente,
incluindo os analfabetos. -
3:10 - 3:14A arte barroca foi o resultado direto
dessa necessidade -
3:14 - 3:17para obras caracterizadas
por uma intensidade emotiva, -
3:17 - 3:20pelo êxtase, sofrimento
e triunfo religiosos. -
3:20 - 3:24E Roma, a capital espiritual e cultural
do mundo cristão, -
3:25 - 3:29tornou-se o epicentro da arte,
da arquitetura e da cultura barrocas, -
3:29 - 3:31durante o século XVII.
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3:33 - 3:352. Igreja de San Luigi dei Francesi
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3:35 - 3:41Muitos artistas, é sabido, são perturbados
difíceis e por vezes problemáticos. -
3:42 - 3:47Caravaggio era uma pessoa que certamente
gostava do lado obscuro da vida, -
3:47 - 3:50e por vezes é referido como
o "menino mau do Barroco". -
3:50 - 3:52um termo por si só problemático.
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3:53 - 3:58Tinha mais de 40 registos policiais
na maioria por atividades violentas, -
3:58 - 4:01e acabou por ser condenado à morte
depois de matar um homem, -
4:01 - 4:05o que o obrigou a passar
a maior parte da sua vida como fugitivo. -
4:06 - 4:09Isso pode levar-nos a pensar
que ele era um ser humano terrível, -
4:09 - 4:12mas, num período de total incerteza
quanto aos sacramentos, -
4:12 - 4:15sobre qual o papel
que os santos desempenhavam, -
4:15 - 4:17sobre o que acreditar e porquê,
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4:17 - 4:21também o tornou mo artista perfeito
para exprimir a tensão incrível -
4:21 - 4:24que era tão predominante
neste período da pós-reforma. -
4:25 - 4:29Também era o artista mais qualificado
para retratar o chamamento de um pecador. -
4:30 - 4:34No final da década de 1590,
Caravaggio estava a trabalhar em Roma, -
4:34 - 4:37a tentar criar um nome na cena
competitiva da arte. -
4:37 - 4:40Já conhecido pela sua natureza rebelde
e temperamento violento, -
4:41 - 4:44que frequentemente entrava em choque
com as suas ambições profissionais, -
4:44 - 4:46Caravaggio tinha dificuldade
em obter encomendas. -
4:47 - 4:51Então, em 1599, depois
de outro artista ter desistido, -
4:51 - 4:55pediram-lhe para ele criar dois quadros
sobre a vida de São Mateus -
4:55 - 4:57para a capela Conterelli
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4:57 - 4:59na igreja barroca
de San Luigi dei Francesi, -
4:59 - 5:01a igreja nacional de França, em Roma.
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5:01 - 5:04Foram estas pinturas,
mais do que quaisquer outras, -
5:04 - 5:05que definem Caravaggio.
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5:06 - 5:10Marcaram o momento em que as convenções
maneiristas do final do século XVI -
5:10 - 5:14— racionais, intelectuais,
talvez um pouco artificiais — -
5:14 - 5:16dão origem ao barroco.
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5:16 - 5:20As duas pinturas enormes deviam ladear
uma estátua de São Mateus -
5:20 - 5:22feita pelo artista flamengo
Jakob Coebert, -
5:22 - 5:25mas os clientes rejeitaram
a estátua acabada -
5:25 - 5:28e pediram a Caravaggio
para criar uma terceira pintura -
5:28 - 5:30para o centro, por cima do altar,
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5:30 - 5:32mostrando São Mateus
a escrever o Evangelho -
5:32 - 5:34sob a orientação de um anjo.
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5:34 - 5:363. O chamamento
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5:37 - 5:40A primeira pintura do trio
é a Vocação de São Mateus. -
5:40 - 5:44que representa o momento na Bíblia
em que Cristo chama Mateus, -
5:44 - 5:46um cobrador de impostos,
para o seguir. -
5:46 - 5:50A cena passa-se numa taberna
romana fracamente iluminada, -
5:50 - 5:54o tipo de local sombrio que Caravaggio
e os seus amigos costumavam frequentar, -
5:54 - 5:58com figuras vestidas com o mesmo tipo
de roupas contemporâneas do século XVII, -
5:58 - 6:00que o artista e os seus amigos usavam.
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6:01 - 6:05Caravaggio incluía com frequência
os seus amigos nas suas pinturas. -
6:06 - 6:10Este é o artista Mario Minitti
que aparece em várias das suas obras -
6:10 - 6:15e, tal como Caravaggio, fazia parte
do submundo da vida romana. -
6:15 - 6:18Mas porque é que Caravaggio
os representa com roupas modernas? -
6:19 - 6:21Seria como entrar hoje
numa igreja -
6:21 - 6:24e ver uma pintura
com contemporâneos de Cristo -
6:24 - 6:27com T-shirts, blue jeans e ténis.
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6:27 - 6:31Mais tarde, Caravaggio irã incluir
armaduras do século XVII -
6:31 - 6:33noutra ilustração
duma história do Evangelho. -
6:33 - 6:36É uma escolha deliberada
para preencher o fosso -
6:36 - 6:39entre a história bíblica
e a realidade do espetador. -
6:39 - 6:41Este anacronismo, aos nossos olhos,
-
6:41 - 6:45era perfeitamente entendido
por um público do século XVII, -
6:45 - 6:48e está em linha
com o pensamento da contra-reforma. -
6:48 - 6:52Dizia ao espetador
que a possibilidade de redenção -
6:52 - 6:55era tão relevante no presente dele
como nos tempos bíblicos. -
6:56 - 6:59Porém, Cristo e Pedro, na pintura,
-
6:59 - 7:02estão ambos descalços e vestidos
com túnicas mais familiares -
7:02 - 7:05que conhecemos das pinturas bíblicas
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7:05 - 7:08o que ajuda a distinguir
o divino do secular. -
7:08 - 7:10Cristo aponta na direção de Mateus
-
7:11 - 7:13que está sentado a uma mesa
-
7:13 - 7:15a contar moedas
com outros cobradores de impostos -
7:15 - 7:19Esse momento capta a surpresa de Mateus
e o seu conflito interior -
7:19 - 7:22quando ele se apercebe
de que está a ser escolhido. -
7:22 - 7:26A composição estrutural
serve de espinha dorsal duma pintura -
7:26 - 7:29e desempenha um papel fundamental
para guiar a experiência do espetador, -
7:29 - 7:32transmitindo um sentido
e criando uma harmonia estética. -
7:33 - 7:36Com tanta coisa que se passa
em todas as três pinturas, -
7:36 - 7:39a estrutura e a simetria
é importante. -
7:39 - 7:41Esta é quase quadrada.
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7:41 - 7:44E depois, no interior, há uma série
de quadrados e retângulos, -
7:44 - 7:46que lhe dão coerência.
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7:47 - 7:51Também tem uma série de diagonais
a partir da luz por trás de Cristo, -
7:52 - 7:55outra diagonal segue
a espada do jovem, -
7:55 - 7:57outra a perna de São Pedro,
-
7:57 - 8:00e outra ainda o ângulo da perna
do rapaz à esquerda. -
8:01 - 8:05O chamamento de Mateus aparece
através do sentido extremo da luz e sombra -
8:05 - 8:09que conhecemos do uso da assinatura
d Caravaggio do claro-escuro, -
8:09 - 8:13uma coisa que analisei
num outro vídeo meu sobre Caravaggio. -
8:13 - 8:16Um raio de luz tem origem
por trás da cabeça de Cristo -
8:16 - 8:20que está à direita, meio escondido
por trás de São Pedro, -
8:20 - 8:22e a luz ilumina o grupo
-
8:22 - 8:25— não pela janela que é visível
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8:25 - 8:27mas a partir duma invisível
origem sobrenatural — -
8:27 - 8:30o que sublinha a ideia de redenção
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8:30 - 8:32de que até um pecador,
-
8:32 - 8:35como um cobrador de impostos,
na sua toca de pecado, -
8:35 - 8:38pode transformar-se
numa coisa extraordinária. -
8:38 - 8:42Uma grande parte da pintura
é espaço em branco, ou melhor, de luz. -
8:42 - 8:44E, como já dito anteriormente,
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8:44 - 8:48a luz é usada na arte religiosa
como uma metáfora para a presença de Deus, -
8:48 - 8:53da divina intervenção ou,
neste caso, de despertar espiritual. -
8:53 - 8:56A luz atinge todos os homens
em volta da mesa -
8:56 - 8:58mas está a ser feita uma escolha
por cada indivíduo -
8:58 - 9:01se deve ou não olhar para a luz.
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9:01 - 9:05Estes dois homens estão mais interessados
em preocupações materiais -
9:05 - 9:07— a contar moedas —
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9:07 - 9:11e na sua indiferença para com Cristo
ou a sua "cegueira espiritual" -
9:11 - 9:14há um contraste com o momento
de reconhecimento de Mateus. -
9:14 - 9:17Há muito menos certeza do que o que vemos
-
9:17 - 9:19em muitos outros tratamentos
do mesmo tema. -
9:19 - 9:23O próprio Mateus não tem a certeza
de estar a ser chamado, -
9:23 - 9:26como indicado tanto
pela sua expressão de interrogação -
9:26 - 9:30como a forma com que aponta
para si mesmo como a perguntar "eu?" -
9:30 - 9:34A forma bastante indecisa
como Cristo aponta para Mateus -
9:34 - 9:35reforça esta ambiguidade
-
9:36 - 9:38e, como vemos, por este raio-X,
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9:38 - 9:40foi uma coisa
em que Caravaggio teve dúvidas. -
9:41 - 9:45As mãos de Cristo, de Pedro e de Mateus
são espantosamente semelhantes. -
9:45 - 9:49A mão de Cristo a apontar
para Mateus é a mais alta, -
9:49 - 9:53seguida pela de Pedro
que reforça a escolha de Cristo, -
9:53 - 9:55e, por fim, pela de Mateus.
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9:55 - 9:59Todas as três fazem o mesmo gesto,
com variações subtis, -
9:59 - 10:02contribuindo
para a simetria da composição. -
10:02 - 10:06Não é coincidência que o gesto de Cristo
repete a mão de Adão -
10:06 - 10:09na "Criação de Adão" na Capela Sistina
de Miguel Ângelo, -
10:09 - 10:12talvez reforçando
a missão divina de Cristo, -
10:12 - 10:16enquanto relaciona subtilmente
o chamamento de Mateus -
10:16 - 10:18com o próprio ato da Criação,
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10:18 - 10:22sugerindo que Cristo está a dar a Mateus
uma nova vida, uma vida espiritual. -
10:22 - 10:26As roupas de Mateus e dos seus amigos
são feitas de tecidos ricos -
10:27 - 10:29— sedas, veludos e brocados —
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10:29 - 10:32as roupas mais belas
do século XVII. -
10:32 - 10:35Juntamente com as moedas,
estes luxos indicam -
10:35 - 10:38que, se Mateus aceitar
o chamamento de Cristo, -
10:38 - 10:40terá de abdicar de muita coisa.
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10:41 - 10:44O martírio, na parede oposta da capela,
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10:44 - 10:46diz-nos que lhe irá custar tudo.
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10:49 - 10:52A inspiração de São Mateus
é a peça central -
10:52 - 10:55e representa o momento
da inspiração de Mateus -
10:55 - 10:57para escrever o Evangelho.
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10:57 - 11:01A primeira coisa a notar é o contraste
entre as duas figuras. -
11:01 - 11:05O anjo desce numa espiral
e parece um raio de luz, -
11:05 - 11:08enquanto Mateus
projeta calor e entusiasmo, -
11:08 - 11:12com se ardesse de inspiração
proveniente do Céu. -
11:13 - 11:15Esta não foi a primeira versão.
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11:15 - 11:19Caravaggio, inicialmente, criou
esta imagem para a capela -
11:19 - 11:21que foi rejeitada pela igreja,
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11:21 - 11:23porque mostrava São Mateus
-
11:23 - 11:27como um camponês sem educação,
despenteado e de pés sujos. -
11:27 - 11:30A pintura foi destruída
na II Guerra Mundial -
11:30 - 11:34mas esta é uma foto do original
que, por vezes, aparece colorida. -
11:35 - 11:38A inclusão de Carvaggio dos pés sujos
num contexto sagrado -
11:38 - 11:41foi radical, crua e autêntica,
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11:41 - 11:45que se afastava da imagética
religiosa idelizada -
11:45 - 11:47e era uma mensagem
de que a santidade e a divindade -
11:47 - 11:51podem encontrar-se nos locais
mais humildes e mais inesperados. -
11:52 - 11:54Ele usava sempre modelos vivos
-
11:54 - 11:57e com frequência de pessoas
pobres ou da classe trabalhadora, -
11:57 - 12:00pedintes, prostitutas, criminosos,
e trabalhadores braçais, -
12:00 - 12:04reforçando assim o realismo
e o divino no interior do vulgar. -
12:05 - 12:08O uso das classes baixas,
de modelos menos que perfeitos, -
12:08 - 12:10para retratar figuras sagradas,
-
12:10 - 12:13é por vezes interpretado como blasfemo
pelos visitantes modernos, -
12:13 - 12:14mas isso não é verdade.
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12:15 - 12:17Embora houvesse críticas
a Caravaggio na sua época, -
12:17 - 12:20ele estava apenas a seguir
ideias da contra-reforma. -
12:20 - 12:24Ao mostrar as realidades
físicas e terrenas da vida, -
12:24 - 12:26a sujidade e a desordem,
-
12:26 - 12:29realçava a natureza humana
e humilde dos seus súbditos, -
12:29 - 12:33correspondendo ao objetivo da igreja
de apelar diretamente às massas. -
12:34 - 12:36Nesta segunda versão
que Caravaggio pintou, -
12:36 - 12:39em vez de Mateus ser totalmente
controlado pelo anjo, -
12:39 - 12:41— como aparece na primeira versão —
-
12:41 - 12:44mostra Mateus ajoelhado,
com um aspeto muito envelhecido, -
12:44 - 12:46inclinado para a frente,
-
12:46 - 12:49como se estivesse profundamente
imerso no ato de escrever. -
12:49 - 12:51O anjo, por cima dele,
-
12:51 - 12:53encoraja-o delicadamente,
ou inspira-o -
12:53 - 12:54e conta pelos dedos
-
12:54 - 12:57quantos versículos Mateus já completou
— em vez de os ditar. -
12:59 - 13:02A interação entre o anjo e Mateus
-
13:02 - 13:04deliberadamente fluida,
-
13:04 - 13:05sublinha que aquele
-
13:05 - 13:08é um processo colaborativo
de inspiração divina, -
13:08 - 13:11e não de total controlo
dum camponês analfabeto. -
13:11 - 13:14Caravaggio relaciona visualmente
as duas figuras: -
13:14 - 13:18o braço direito dobrado de Mateus
corresponde ao braço esquerdo do anjo, -
13:18 - 13:21e a curva do seu braço esquerdo
corresponde ao braço direito do anjo, -
13:21 - 13:25as mãos de ambos estão juntas
os ombros são paralelos. -
13:25 - 13:27Ambos se inclinam para a frente
na direção da mão direita, -
13:27 - 13:29ambos levantam a perna esquerda
-
13:29 - 13:32e ambos esticam a perna direita.
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13:32 - 13:34Contrariamente à primeira versão
deste episódio -
13:34 - 13:37as asas do anjo são escuras,
-
13:37 - 13:39difíceis de detetar contra o fundo escuro,
-
13:39 - 13:41o que dá à obra um sentido de drama,
-
13:41 - 13:44de tensão ou de presságio
do que está para acontecer. -
13:44 - 13:47O anjo parece estranhamente
enraizado e tangível, -
13:47 - 13:50consistente com o estilo
naturalista de Caravaggio. -
13:51 - 13:53Embora não sejam idênticas,
há um eco visual -
13:53 - 13:56entre a posição do Deus de Miguel Ângelo
-
13:56 - 13:58e o anjo de Caravaggio.
-
13:58 - 14:01Ambas as figuras se inclinam
para o ser humano seu equivalente -
14:01 - 14:04num gesto de comunicação
ou intervenção divina. -
14:05 - 14:08Mais ainda, o drapeado em ambas as obras
flui dinamicamente, -
14:08 - 14:12acrescentando o sentimento
de movimento e de energia divina. -
14:18 - 14:20O martírio é a última obra das três.
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14:20 - 14:21Segundo a tradição,
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14:21 - 14:24o santo foi matado por ordem
do rei da Etiópia, -
14:24 - 14:26quando celebrava a Missa no altar.
-
14:27 - 14:29Caravaggio opta pelo momento
-
14:29 - 14:32em que o assassino já
apunhalara Mateus uma vez -
14:32 - 14:35e está prestes a desferir o golpe fatal.
-
14:35 - 14:38Vemos o sangue salpicado
proveniente do primeiro golpe. -
14:39 - 14:43É o tipo de violência que Caravaggio
conhecia demasiado bem. -
14:44 - 14:46O artista não está interessado
-
14:46 - 14:49no ambiente físico da sua pintura,
-
14:49 - 14:52e o altar
— tão importante noutras versões — -
14:52 - 14:55está quase totalmente obscurecido
pela nuvem do anjo. -
14:56 - 14:59O anjo, com a cabeça coberta
de espessos caracóis castanhos -
14:59 - 15:01e um corpo musculado de adolescente,
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15:01 - 15:03é parecido com o da "Inspiração"
-
15:03 - 15:06e quase certamente foi o mesmo modelo.
-
15:06 - 15:09Parece ter sido inspirado
pela pintura de Ticiano. -
15:09 - 15:13Os mártires estão em posições
idênticas — embora inversas. -
15:13 - 15:17O assassino ergue-se sobre o santo,
com uma mão a agarrar-lhe no braço, -
15:17 - 15:19e a outra mão erguida com uma arma.
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15:20 - 15:23O companheiro ao lado
recua em pânico e foge, -
15:23 - 15:25quase como uma imagem espelhada.
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15:25 - 15:27E os anjos aproximam-se do santo,
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15:27 - 15:30com uma folha de palmeira,
símbolo do martírio. -
15:30 - 15:34Caravaggio nunca tinha pintado
uma tela tão grande, -
15:34 - 15:35nem uma tela com tantas figuras
-
15:35 - 15:39e parece que isso lhe provocou
uma grande dificuldade. -
15:39 - 15:43Os rios-X revelaram duas tentativas
em separado, na composição. -
15:43 - 15:46Inicialmente, era uma pintura
muito mais preenchida -
15:46 - 15:49com algumas características
arquiteturais -
15:49 - 15:51e muito mais personagens.
-
15:51 - 15:54Ao eliminar esses elementos
e abolir a arquitetura, -
15:54 - 15:57Caravaggio retira todas as distrações
da história principal, -
15:58 - 16:00o martírio de Mateus
-
16:00 - 16:03Cada figura na pintura
— muitas delas com roupas contemporâneas — -
16:03 - 16:05é um indivíduo,
-
16:05 - 16:07o artista deve ter escolhido
nas ruas de Roma, -
16:07 - 16:10cada um deles tem a sua expressão própria
-
16:10 - 16:13que vai da indiferença
à curiosidade ou ao medo. -
16:13 - 16:15Estes três homens estão de tanga,
-
16:15 - 16:18portanto estão à espera
de serem batizados por Mateus. -
16:18 - 16:20O próprio assassino está de tanga,
-
16:20 - 16:24o que sugere que fingiu ser
um dos que esperava ser batizado. -
16:25 - 16:29Se olharmos para esta figura aqui,
vemos um auto-retrato de Caravaggio, -
16:29 - 16:32uma parecença que reconhecemos
de outras pinturas dele. -
16:32 - 16:34E, se olharmos com atenção,
-
16:34 - 16:37as nádegas nuas de Caravaggio revelam
que ele também está de tanga, -
16:37 - 16:40sugerindo que também ele
estava à espera de ser batizado, -
16:40 - 16:42mas agora está a fugir.
-
16:42 - 16:46Um comentário, talvez, de que ele,
tal como as outras pessoas que fogem -
16:46 - 16:49teria tido falta de coragem
para ajudar São Mateus. -
16:50 - 16:53No caso de "O Martírio",
a luz suave provém da esquerda, -
16:53 - 16:56enquanto em "O Chamamento"
provém da direita -
16:56 - 16:59e em "A Inspiração" provém de cima.
-
16:59 - 17:03Por outras palavras, é como se a luz
da janela real da Capela -
17:03 - 17:05se estenda pelas três pinturas.
-
17:06 - 17:09Ele usa a luz para nos guiar
em volta das pinturas -
17:09 - 17:12e para apanhar os elementos
mais importantes do tema, -
17:12 - 17:16do mesmo modo que um projetor
ilumina a ação num palco. -
17:17 - 17:20Os nossos olhos são dirigidos
para a figura central, -
17:20 - 17:23o assassino, que também é
o que está mais iluminado. -
17:23 - 17:26Seguimos o braço dele até São Mateus,
-
17:26 - 17:29que parece levantar a mão
para se proteger, -
17:29 - 17:32mas na verdade está estendida para o anjo
(que só ele vê), -
17:32 - 17:36que, por seu turno, lhe estende a mão,
com a palma na mão. -
17:36 - 17:38Isto não é uma pintura sobre o medo,
-
17:38 - 17:41mas, pelo contrário, um momento
de alegria ou de êxtase -
17:41 - 17:46— uma forma comum de martírio
retratada pelos artistas barrocos — -
17:46 - 17:48como veremos com Bernini.
-
17:48 - 17:51Mais uma vez Caravaggio
usa imagens espelhadas e equilibrio -
17:51 - 17:52para criar a simetria
-
17:52 - 17:56e ajudar a guiar os olhos do espetador
para as figuras principais. -
17:56 - 18:00O assassino e São Mateus
estão colocados simetricamente -
18:00 - 18:02e, se virarmos São Mateus ao contrário,
-
18:02 - 18:05vemos que é uma imagem espelhada.
-
18:05 - 18:07São Mateus estende a mão para o anjo
-
18:07 - 18:09que lhe passa a palma do martírio
-
18:09 - 18:12com ambos os braços formando
um ângulo de 90º com os corpos, -
18:12 - 18:15criando uma linha reta vertical
que atravessa a pintura. -
18:15 - 18:18Tal como "A inspiração de São Mateus",
-
18:18 - 18:21a posição dos corpos
é quase idêntica: -
18:21 - 18:24o braço direito dirigido
para o braço esquerdo dobrado, -
18:24 - 18:26a perna esquerda esticada,
-
18:26 - 18:28a perna direita virada para trás,
sem ser vista. -
18:28 - 18:32O movimento e a energia
em todas as três pinturas são intensos. -
18:32 - 18:36Há um verdadeiro sentido
de diálogo e de movimento. -
18:36 - 18:40As figuras estão no meio da ação,
captando um movimento específico -
18:40 - 18:42e reforçando o drama
-
18:42 - 18:45que parece estar a ocorrer
aqui mesmo, neste mesmo momento. -
18:45 - 18:49As personagens debruçam-se,
viram-se, fazem caretas, -
18:49 - 18:52e gesticulam, dando vida
às narrativas bíblicas -
18:52 - 18:54com uma prontidão sem precedentes.
-
18:54 - 18:56É anacrónico, claro,
-
18:56 - 19:01mas há uma boa razão para chamar
cinemática à arte de Caravaggio, -
19:01 - 19:04trezentos anos antes
de ser inventado o cinema. -
19:04 - 19:07A obra dele teve uma influência imediata
-
19:07 - 19:12em artistas como Peter Paul Rubens,
Artemisia Genrileschi e Brnini, -
19:12 - 19:14mas no século XX
-
19:14 - 19:17a sua influência alargou-se
à arte do cinema e da cinematografia, -
19:17 - 19:20nos muitos filmes que foram influenciados
-
19:20 - 19:23pelo estilo visual
e pelos temas do pintor. -
19:24 - 19:28Os seus quadros de São Mateus marcaram
um ponto de viragem na sua carreira, -
19:28 - 19:31e ele tornou-se no pintor
mais apreciado de Roma. -
19:32 - 19:35Mas o êxito dele nessa cidade
foi de curta duração. -
19:38 - 19:43Em 28 de maio de 1606, Caravaggio
envolveu-se num duelo mortal -
19:43 - 19:46com um homem chamado
Ranuccio Tomassoni, -
19:46 - 19:50provavelmente por uma disputa
relacionado com jogo, -
19:50 - 19:52com uma amante ou com honra pessoal.
-
19:52 - 19:56A luta ocorreu no Campo Marzio
no distrito de Roma -
19:56 - 19:59e Caravaggio feriu Tomassoni mortalmente.
-
19:59 - 20:03Em Roma, na época, o assassínio era
um crime capital, punível com a morte. -
20:04 - 20:07Foi emitido um "bando capital",
ou seja, mandado de captura, -
20:07 - 20:09o que significava que qualquer pessoa
-
20:09 - 20:12podia legalmente matar Caravaggio
e reclamar uma recompensa. -
20:12 - 20:16Em 1610, o artista já andava a viver
no exílio há quatro anos, -
20:16 - 20:19movimentando-se entre Nápoles,
malta e Sicília, -
20:19 - 20:22procurando a proteção
de patronos poderosos -
20:22 - 20:25que ignoravam as sua condenações
criminosas -
20:25 - 20:28enquanto ele continuasse
a pintar obras primas para eles. -
20:28 - 20:31A obra dele deste período
reflete com frequência -
20:31 - 20:34temas de culpa, de mortalidade
e de redenção. -
20:34 - 20:37Esta imagem mostra-o
como sendo Golias, o derrotado, -
20:37 - 20:39e o seu antigo assistente
enquanto David. -
20:40 - 20:45Caravaggio morreu em Porto Ercole
a 18 ou 19 de julho de 1610 -
20:45 - 20:47aos 38 anos.
-
20:47 - 20:50A causa exata da morte
mantém-se incerta. -
20:50 - 20:55A sua morte prematura
— alguns diriam sem surpresa — -
20:55 - 20:57deram um fim trágico à história dele
-
20:57 - 21:00mas deixou para trás
um legado de arte revolucionária -
21:00 - 21:03que mudou o decurso
da pintura ocidental. -
21:06 - 21:08Em parte em duas das grandes
cidades artísticas, Roma, -
21:08 - 21:12eu procuro em duas outras igrejas barrocas
que contêm importantes obras primas. -
21:13 - 21:18Uma é uma enorme ilusão ótica
pintada num teto plano, -
21:18 - 21:20por um irmão jesuíta, Andrea Pozzo.
-
21:20 - 21:23E outra mostra o assassínio
de uma freira carmelita espanhola, -
21:23 - 21:28criada por outro artista perturbado
e violento - Gian Lorenzo Bernini. -
21:36 - 21:39Tradução de Margarida Mariz (2025)
- Title:
- Great Art Cities: Roma - Caravaggio, Bernini e Pozzo
- Description:
-
Roma é o berço do Barroco, o estilo altamente ornamentado e elaborado de arquitetura, arte e design que floresceu na Europa no século XVII e na primeira metade do século XVIII. Ao contrário do Renascimento, que tinha tudo a ver com controlo e equilíbrio perfeito, a era barroca ficou famosa pelo seu toque dramático e sentido de movimento.
Neste episódio, o Great Cities Explained sai das galerias e museus e entra em três igrejas barrocas que ainda abrigam obras de Caravaggio, Pozzo e Bernini hoje.... e não custam nada para visitar.
Traduzido com a versão gratuita do tradutor - DeepL.com
- Video Language:
- English
- Duration:
- 21:39
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Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for Great Art Cities: Rome - Caravaggio, Bernini and Pozzo | |
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Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for Great Art Cities: Rome - Caravaggio, Bernini and Pozzo |